O PAI ADORAVA LER (FOTO: GOOGLE) |
Papi, meu sogro, foi gente da melhor qualidade. Sua principal
característica era falar, falar, falar. Adorava falar. E falava alto. O assunto
sempre era detalhe menor. Bastava lhe dizer “bom dia”, e o papo estava
garantido. Os mais escolados puxavam uma cadeira.
Para
que incorporasse o “comandante” Fidel, não eram necessários mais que segundos.
Em dia de garganta arruinada, coisa que nunca vi, a preleção era mais curta: de
duas horas, em média. Quando lhe dava na telha, pedia licença e colocava ponto final na prosa.
O
pai, ao contrário, sempre foi quieto, recatado. Raramente, elevava o tom de
voz. Mas não havia chance de lhe dizer “bom dia” e não receber algum incentivo,
um conselho, um livro emprestado.
Dois estilos, dois mestres.
***
O
pai nunca foi homem de farra, nunca teve muitos amigos. Gostava mesmo era de
ler e reler seus muitos livros. E de fazer planos, ainda que já não tivesse
mais condições de colocá-los em prática. Sempre foi um homem afável, mas sem
tempo para, como se diz, jogar conversa fora.
--
Por que o senhor não desce e vai conversar com outras pessoas lá embaixo, no
jardim? Fica tão só...
Era
o que sempre lhe perguntavam, a começar por minha irmã e eu.
E
ele nos dizia:
--
Não tenho nada contra ninguém, não. Tenho uma relação cordial com todos os que
moram no prédio. Também não me sinto melhor ou pior que os outros. Mas o que
tenho para lhes falar não é do interesse deles. A recíproca é verdadeira. E a
vida é curta, filho. Nunca dá tempo para a gente ler tudo o que precisava ler.
(OS –
Atualizado em fevereiro de 2017)
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