terça-feira, 28 de março de 2017

CRÔNICA: WALCYR CARRASCO



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SOMOS TODOS ROMÂNTICOS

A mulher forte quer poder ser frágil. E o homem forte,
às vezes, só deseja uma mulher que dê a ele o direito de chorar

POR WALCYR CARRASCO
REVISTA ÉPOCA – 21/03/

Ela é feminista. Liberada. Vai à balada, escolhe quem quer. Mas anda com um sapatinho de cristal na bolsa. Ele também. Tímido ou pegador, sonha, no fundo, com aquela moça que diz sim a tudo. Os tempos mudaram, as ideias evoluíram. Mas, no íntimo, cada um sonha com um príncipe ou princesa encantado. Um garoto na adolescência faz uma divisão clara e cruel. Há as garotas “galinhas”, para “pegar”. E as para namorar. As “galinhas” topam relações eventuais, porque gostam. Como se gostar de sexo fosse algo negativo. O que ele quer, enfim? Uma difícil. Que, além do interesse físico, proporcione o sentimento romântico, acalente a ideia de um dia ter lar e filhos. Mesmo que seja apenas um sonho distante. Uma amiga comentou, desanimada, que, cada vez que saía com alguém, o sujeito já propunha um motel. Ela ia, por acreditar que era o começo de uma relação. Ensinei-lhe a velha regra que li em algum texto americano.

– Nunca da primeira ou segunda vez. Só na terceira ou quarta vez que saírem.

Ela não viu muito sentido, mas... Era romântica. Queria uma relação. Ele ficou nervoso da primeira e da segunda. Na quarta, já estavam namorando. E ainda dizia aos amigos.

– Ela não é qualquer uma.

Os amigos se calavam. Todos já tinham ido com ela ao motel.

Sonhos românticos estão em alta. Há grupos, geralmente evangélicos, que só praticam sexo depois do casamento. Ele e ela. O caso mais famoso foi o do jogador Kaká. Parece estranho para a maioria de nós, que prefere fazer sexo em todas as oportunidades possíveis. Mas funciona. O namoro começa com o sonho de encontrar alguém ideal. Continua com o desejo reprimido, no máximo um beijinho. Quando o sexo acontece, depois do casamento, é uma explosão. Pode não ser tão bom – o sexo, como o esporte, exige prática para melhorar. Mas para o casal é o máximo. Existe projeto romântico maior? Ter alguém único, que nos preencha totalmente, é um sonho tão forte que a ideia de existir uma “alma gêmea” mexe com a gente. Fiz uma novela com esse nome e foi um sucesso absoluto na Rede Globo, inclusive na reapresentação.

As pessoas gostam de achar que são duras e realistas. Homem, então, nem se fala. Mas os contos de fadas continuam perpetuamente em alta. O príncipe continua a amar Branca de Neve até quando parece morta, em um caixão de vidro. Na Bela Adormecida, o príncipe a acorda com um beijo depois de 100 anos. Sem perguntar se ela tinha escova de dentes. Vibramos com essas histórias enquanto a Disney enriquece! A mulher mais forte sente o coração bater rápido ao imaginar que ainda surgirá alguém que a compreenda carinhosamente. Que a tire da torre e permita que seja frágil. Vale o mesmo para o homem forte: às vezes, só deseja uma mulher que lhe dê o direito de chorar.

A mesma visão de mundo foi transposta para o mundo LGTB. Se não fosse uma vitória da identidade sexual, a questão do casamento seria ultrapassada. Muitos casais héteros não fazem questão das alianças. Mas, para o mundo LGTB, é uma conquista. Nas baladas mais fervidas, há dezenas de rapazes sem camisa com um sapatinho de cristal escondido em algum lugar. Alguns nem vão às baladas. Diz um amigo:

– Lá, a gente nunca encontra um relacionamento sério.

Bem, acho difícil descobrir um grande amor pulando que nem cabrito na pista.

No meio LGTB, sabe-se: o grande sonho do amor romântico costuma ser realizado pelas lésbicas. Dizem haver diferença quando dois homens ou duas mulheres passam uma noite juntos. No dia seguinte, entre elas, uma se muda para a casa da outra. Entre eles? Bem... Nem há dia seguinte. Relacionamentos entre mulheres costumam ser mais estáveis e duradouros. Tento explicar. Homens, por mais modernos que sejam, são criados como caçadores. Desejam conquistar. Mulheres, queiram ou não, vivem o sonho de Cinderela desde a infância. Quando duas Cinderelas se encontram, para que príncipe?

Alguns dos meus amigos recém-separados que conhecem uma mulher logo acreditam:

– Ela não pensa em casar.

Sempre aviso:

– Pensa, sim. Chega um tempo que passarinha faz ninho. Mulher quer relacionamento estável, mesmo se diz que não. É da natureza humana.

Passarinha? Acho que, no fundo do romantismo, há algo de atávico, parte do modo de ser humano. Certos impulsos vêm de nossa profunda origem animal. Casar-se e ter filhos, adotar crianças, fazer ninho, é um deles. O romantismo, em suas diversas formas, é a expressão máxima da sobrevivência da espécie.

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