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O
PODER NO BANCO DOS RÉUS
Se,
na área penal, antiguidade fosse posto, ou mesmo
servisse
de atenuante, homicídio não seria crime,
ou
pelo menos não tão grave, já que inaugurado
com
Caim, na origem da humanidade
Por
Ruy Fabiano
Via
Blog do Noblat
18/03/2017
| 01h30
A
longevidade de um delito, como é óbvio, não o legitima. No entanto, esse é o
argumento central com que políticos e financiadores de campanhas reclamam
inocência – e exigem absolvição -, diante dos crimes de caixa dois e derivados.
“Sempre
se praticou”, dizem uns; “desse jeito, ninguém escapará”, dizem outros. As
variantes são nesse rumo.
O
próprio Emílio Odebrecht, pai de Marcelo, em depoimento ao juiz Sérgio Moro,
espantou-se com o fato de tal prática estar sub judice. E não escondeu que sua
empresa a endossa desde sempre e que ele próprio - assim como seu falecido pai
e fundador do grupo, Norberto Odebrecht - não via nenhum problema nisso.
A
Lava Jato não desconhece a tradição da prática, mas, digamos assim, diverge
conceitualmente dos Odebrecht. Está convencida de que não apenas é preciso
erradicá-la, como o único meio de fazê-lo é punindo os que a praticaram. O país
concorda.
Se,
na área penal, antiguidade fosse posto, ou mesmo servisse de atenuante,
homicídio não seria crime, ou pelo menos não tão grave, já que inaugurado com
Caim, na origem da humanidade.
As
delações dos 77 executivos da Odebrecht, cuja divulgação é aguardada, não encerram
– antes inauguram – a principal fase da Lava Jato, a que vai ao coração do
Congresso e do governo, este e o que o precedeu. Não se trata nem sequer de
saber quem vai preso. Trata-se de expor as entranhas de um sistema que liquidou
o país.
Os
delitos, de fato, não são iguais, nem da mesma gravidade; uns devem ser presos,
outros não; uns misturaram caixa dois com propina; outros só o caixa dois;
outros lavaram a propina no caixa um. Etc. O dano político, porém, é geral. Não
absolve ninguém.
De
cara, os presidenciáveis de sempre – uma geração em fim de carreira,
distribuída nos principais partidos – já foram citados e estão na condição que
o falecido Antonio Carlos Magalhães considerava a mais letal a um político: ter
de se explicar. Têm tentado, mas encontram compreensão apenas entre colegas.
Isso
explica o ressurgimento do voto em lista fechada exatamente neste momento em
que os políticos temem o contato com as ruas. Trata-se de poupá-los do cara a
cara com o eleitor. Este votaria apenas na legenda, ficando o encargo de
preencher a lista por conta do próprio partido – ou por outra, dos caciques do
partido.
É
piorar o que já não é bom. O argumento dos que querem as listas fechadas é de
que criam um elo mais forte entre eleitores e partidos. Vota-se no partido, não
em candidatos. Em tese, sim, mas com esses partidos? De quebra, a novidade os
reduziria – há hoje 35 legendas, 28 com assento no Congresso, o que faz com que
cada votação seja precedida de um imenso toma lá dá cá.
Mas,
se houvesse mesmo interesse em reduzir o número de partidos, bastaria extinguir
as coligações nas eleições para deputado.
O
que se contempla, neste momento, é uma desesperada tentativa de sobrevivência
da velha política, diante da renovação compulsória que o fenômeno da Lava Jato
vem impondo.
O
strip-tease moral é avassalador e, quando se pensa que já se viu tudo, surge
outro escândalo com conexões políticas: a carne envenenada. Atinge em cheio o
setor mais produtivo do país, o agronegócio, responsável, de algumas décadas
para cá, pelo superávit da balança comercial.
O
escândalo é localizado, no segmento carne, mas suas consequências, não:
desmoralizam as certificações oficiais do Brasil indistintamente, com reflexos
profundos nas exportações.
De
quebra, outro problemão para o presidente Temer: seu recém-empossado ministro
da Justiça, Osmar Serraglio, estaria envolvido na história, acusado de
apadrinhar um dos mafiosos. Mesmo inocente, terá dificuldades de ordem moral e
política para prosseguir no cargo. E assim caminha o governo, num entre e sai
de ministros, respingados pela lama da corrupção. Antes assim.
A
Lava Jato chega ao terceiro ano e não tem data para terminar. O país oficial
continua no banco dos réus.
Ruy Fabiano é jornalista
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