IMAGEM: ARQUIVO GOOGLE |
HÁ UM MENTIROSO
ENTRE OS DELATORES DA ODEBRECHT
Por Josias de Souza
UOL – 08/03/2017|04:00
Num acordo de colaboração judicial, pode-se desconfiar das verdades
dos delatores. Mas uma mentira deslavada, quando apanhada no pulo, revela-se
sempre rigorosamente verdadeira. Por isso, um dedo-duro jamais deve dizer uma
mentira que não possa provar. Do contrário, prêmios judiciais como a redução da
pena podem ser anulados e convertidos em castigos mais severos.
A Justiça Eleitoral intimou três delatores da Odebrecht para uma
acareação. Entre eles o príncipe-herdeiro Marcelo Odebrecht e o ex-executivo da
construtora Claudio Melo Filho. Um dos dois mentiu ao ministro Herman Benjamin,
do TSE, sobre o jantar ocorrido em 2014, no Palácio do Jaburu —aquele rumoroso
repasto em que Michel Temer mordeu uma doação de R$ 10 milhões da Odebrecht
para o PMDB.
Se o mentiroso for Marcelo Odebrecht, Michel Temer, que já frequenta
a cena de modo constrangedor, ficará numa posição ainda mais vexatória. Por
ora, sabe-se que Temer, hoje um presidente-tampão com o mandato sub judice,
levou um empreiteiro à mesa de jantar do Jaburu, para fazer-lhe a corte e rogar
por uma contribuição eleitoral. A partir desse ponto, começam as contradições.
De acordo com o depoimento de Marcelo Odebrecht, o jantar do Jaburu
serviu apenas para um “shaking hands”. No idioma de Camões: um “aperto de
mãos”, para selar um acordo entre cavalheiros. Nessa versão, o valor da mordida
e a forma de pagamento não foram discutidos na presença de Temer. O acerto dos
detalhes teria ficado a cargo de Claudio Melo Filho e Eliseu Padilha.
O problema é que, inquirido pelo ministro Herman Benjamin cinco dias
depois, Melo Filho reiterou declarações que fizera aos procuradores da Lava
Jato no âmbito do seu acordo de delação. Repetiu que o valor do repasse —R$ 10
milhões— foi acertado por Mercelo Odebrecht diretamente com Temer. Reiterou que
o acordo Temer envolveu também a distribuição do dinheiro.
Melo Filho esclareceu a Herman Benjamin, relator do processo que
pode resultar na cassação do mandato de Temer, que o agora presidente da
República pediu explicitamente uma contribuição para o PMDB. O delator declarou
que coube a Marcelo Odebrecht oferecer R$ 10 milhões. O empreiteiro sugeriu que
o dinheiro fosse repassado integralmente à campanha de Paulo Skaf. A sugestão
não agradou.
Lero vai, lero vem ficou entendido, sempre na presença de Temer, que
a verba deveria abastecer outras campanhas além da de Skaf. Segundo Claudio
Melo Filho, foi Marcelo Odebrecht quem propôs o rateio: R$ 6 milhões iriam para
a campanha de Skaf e R$ 4 milhões seriam repassados a Eliseu Padilha, que
cuidaria de redistribuir os recursos para outros candidatos, a critério do
PMDB.
Em nota oficial divulgada na semana passada, Temer agarrara-se à
versão de Marcelo Odebrecht, que lhe soara mais conveniente. Sustentara que,
como presidente do PMDB, era seu papel pedir ajuda financeira para candidatos
da legenda. Reafirmara que todo o dinheiro recebido da Odebrecht pelo PMDB —R$
11,3 milhões— foi declarado à Justiça Eleitoral. Ecoando o empreiteiro,
acrescentara não ter discutido cifras.
Por mal dos pecados, o enredo de Claudio Melo Filho parece fazer
mais nexo. Sobretudo depois que Marcelo Odebrecht, apertado pelo ministro
Herman Benjamin, se autodefiniu como um “otário do governo”, um “bobo da
corte”. Só falta mimetizar Tim Maia na acareação do TSE, marcada para
sexta-feira. O gênio da música dizia: “Não fumo, não bebo e não cheiro. Só
minto um pouco.”
Em tempo: chama-se Hildebrando Mascarenhas o terceiro delator da Odebrecht
intimado pelo ministro Herman Benjamin a participar da acareação agenda para
esta sexta-feira. No organograma da empreiteira, cabia a Hildebrando comandar o
Departamento de Operações Estruturadas, eufemismo para departamento de
propinas. No seu depoimento à Justiça Eleitoral, Mascarenhas declarou que,
entre 2006 e 2014, o seu Deprop borrifou no caixa dois das campanhas eleitorais
brasileiras a bagatela de US$ 3,4
bilhões. Em moeda nacional: R$ 10,5
bilhões, ao câmbio de hoje. Nunca antes na história desse país viera à luz
uma caixa clandestina desse tamanho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário