RICARDO BOECHAT É JORNALISTA (GOOGLE) |
DEMOCRACIA SEM BALA
Pela
primeira vez de forma tão ostensiva, quadrilhas de perfis diversos atuaram numa
campanha com o objetivo de formar bancadas próprias
Por
Ricardo Boechat
Site
Isto É – 30/09/2016
Há
um fenômeno novo no panorama político brasileiro. Ele se expôs em dimensão
inédita na temporada eleitoral que termina neste domingo – na grande maioria
das cidades, e terá prosseguimento em outras, onde vai haver segundo turno –
com a definição dos vitoriosos entre os mais de 450 mil postulantes a mandatos de prefeito e vereador.
Essa
novidade passa ao largo do campo ideológico, programático ou partidário. Não
inspira debates, nem almeja conquistar mentes. Seu combustível é o medo. Pela
primeira vez de forma tão ostensiva, quadrilhas de perfis diversos atuaram numa
campanha com o objetivo de formar bancadas próprias.
Segundo
o site “Congresso em Foco”, apenas
em agosto e setembro, 20 candidatos
foram assassinados em diversas cidades. Só no Rio de Janeiro, em um ano, a
polícia contabilizou 16 mortos,
enquanto o jornal “O Estado de S. Paulo”
identificou 96 vítimas nos nove
primeiros meses de 2016, numa lista que inclui, também, cabos eleitorais e
assessores diversos.
É
fato que a cada dois anos o caminho para as urnas contabiliza atentados aqui e
ali. São muitos os registros do gênero na história das eleições, mas o combustível
predominante da carnificina sempre foi a rivalidade política entre
concorrentes.
O
que distingue o cenário atual dos anteriores, além do elevado número de
vítimas, é o aumento das ocorrências nos grandes centros urbanos (o interior
sempre predominou nas estatísticas) e a natureza dos ataques. Tudo indica que
não estamos diante de um agravamento da “clássica” violência eleitoral, mas de
claros sinais indicando que o crime organizado acionou seu poder de fogo para
inserir-se no campo formal da política, abocanhando fatias da representação
parlamentar e do comando da máquina pública. Muitos países já enfrentam essa
ameaça e todos pagaram caro, especialmente os que ainda lutam para derrotá-la.
Um
erro comum, que encareceu esse preço coletivo, foi menosprezar o risco da
situação.
Embora
representem gigantesco desafio para a sociedade, as variadas delinquências que
convivem com a política no Brasil podem ser derrotada “por dentro” da própria
política, através da lenta, mas eficaz, depuração eleitoral e do aprimoramento
das leis.
Já
a estreia do crime organizado nesse ambiente, com suas escalas e métodos,
projeta outro horizonte, ainda estranho a nós, mas, sem dúvida, muito mais
difícil de enfrentar.
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