AMARILDO |
SILÊNCIO DE SERRA É DE
UMA ELOQUÊNCIA GRITANTE
POR JOSIAS DE SOUZA
UOL – 28/10/2016, ÀS 06:04
Dois executivos da Odebrecht — Pedro Novis e Carlos Armando
Paschoal— esmiuçaram à força-tarefa da Lava Jato a denúncia de que a
empreiteira repassou R$ 23 milhões
por baixo da mesa à campanha presidencial do grão-tucano José Serra, em 2010.
Deram nome e sobrenome aos operadores do caixa dois: os ex-deputados Ronaldo
Cezar Coelho (ex-PSDB e hoje no PSD) e Márcio Fortes (PSDB-RJ).
Procurado pela repórter Bela Megale, autora da notícia que trouxe à
luz as novidades, Serra, hoje chaceler do governo Michel Temer, mandou sua
assessoria dizer que ''não vai se pronunciar sobre supostos vazamentos de
supostas delações relativas a doações feitas ao partido em suas campanhas''.
Hummmmm… Reiterou que “não cometeu irregularidades.''
Certos silêncios soam com uma eloquência gritante. Até os surdos
compreendem a pujança do não dito. Quem se prende apenas ao que é transmitido
expressamente jamais ouvirá o que é comunicado no ausente. Serra ainda não se
deu conta. Mas seu não comentário o transforma numa caricatura do personagem
que imagina ser.
CONTRA CRIME ORGANIZADO,
ESTADO ESCULHAMBADO
UOL - 28/10/2016, ÀS 05:13
Os poderosos da República reúnem-se nesta sexta-feira em Brasília
para incluir a segurança pública na agenda nacional. Michel Temer declarou na véspera
que “nós temos uma harmonia absoluta entre os Poderes do Estado.” De fato, a
República atingiu um grau de harmonia poucas vezes visto. As autoridades já não
discutem. Na verdade, elas nem se falam. Ficou fácil entender por que a
criminalidade prevalece. O crime é organizado porque o Estado ficou
esculhambado.
Deve-se a realização do encontro a uma sugestão da ministra Cármen
Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal. Ela se inquietou com as
penúltimas ebulições ocorridas em presídios do Norte e do Nordeste. Chegou
mesmo a visitar uma penitenciária no Rio Grande do Norte. Agora, ao falar sobre
prisões e criminosos num encontro com a presença de Renan Calheiros. Haja
harmonia!
“Heroi da governabilidade, Renan carrega sua virtude no coldre.
E passou a semana distribuindo rajadas de harmonia”
Uma semana antes da reunião desta sexta, Cármen Lúcia marcou para 3
de novembro o julgamento da ação que decidirá se um réu pode ocupar cargos
situados na linha de sucessão da República — presidente do Senado, por exemplo.
Na sequência, a ministra terá a oportunidade de pautar o julgamento de uma
denúncia que se encontra sobre sua mesa. Nela, a Procuradoria pede que Renan
seja enviado ao banco dos réus sob a acusação de pagar despesas de uma filha
que teve fora do casamento com propinas recebidas da Mendes Júnior.
Esse encontro em que os Poderes do Estado colocarão toda sua harmonia
a serviço da segurança dos brasileiros esteve na bica de ser cancelado. Renan
achou que alguns dos participantes não estavam à sua altura. Ameaçou voar para
Alagoas. Temer teve de suar a língua para segurá-lo em Brasília. Renan decidiu
fazer o favor de abrilhantar a reunião com sua presença. Heroi da
governabilidade, Renan carrega sua virtude no coldre. E passou a semana
distribuindo rajadas de harmonia.
Chamado por Renan de “chefete de polícia”, o ministro Alexandre
Moraes (Justiça) levará para o encontro um esboço de plano nacional de
segurança. Contém providências que dependem de aprovação no Congresso. Renan
decerto não economizará esforços para ajudar o “chefete” Alexandre. Sobretudo
depois que ele lhe pedir desculpas por ter permitido que a Polícia Federal
“invadisse” o Senado, para cumprir mandados de prisão e de busca e apreensão
expedidos por um “juizeco de primeira instância.”
Se Deus pudesse escolher um lugar para morar, apesar de toda a
insegurança, esse lugar seria o Brasil. Como o Todo-Poderoso não pode, Renan o
substitui. A despeito da “harmonia absoluta”, o mais provável é que a reunião
desta sexta produza resultados apenas cenográficos. Mas pelo menos a ministra
Cármen Lúcia terá a oportunidade de propor refinar a análise do problema.
Ao falar sobre prisões e criminosos na presença de Renan, a
presidente do Supremo talvez se anime a abrir o debate perguntando: “Vamos
abordar o problema de fora pra dentro ou de dentro pra fora?”
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