CHARGE: AROEIRA |
ACOSTUMA-TE À LAMA QUE TE ESPERA
(E OUTRAS CINCO NOTAS)
Fique claro que, sem o trator Cunha no comando
da Câmara, o impeachment seria só uma proposta,
Dilma estaria no Poder, e Temer não
POR CARLOS BRICKMANN
BLOG DO AUGUSTO NUNES
23/10/2016 às 7:51
Eduardo Cunha, planejador meticuloso, sabia que ser preso era seu
destino. Deve estar pronto para suportar o período atrás das grades. Mas, para
ele, esta prisão era aceitável, fazia parte do jogo. O que o magoou muito foi a
atitude de seus aliados, que o entregaram a Sérgio Moro.
Fique claro que, sem o trator Cunha no comando da Câmara, o
impeachment seria só uma proposta, Dilma estaria no Poder, e Temer não. Temer
deve seu posto a Cunha; a oposição e os governistas que mudaram de lado devem
seu poder e seus cargos atuais a Eduardo Cunha. Mas não hesitaram em condená-lo
no conselho de Ética (faltou apenas um deputado que virasse o voto!) e em
cassar seu mandato, entregando-o à mão severa de Moro. Cunha queria só adiar um
pouco a votação, para que as festas natalinas jogassem o problema para
fevereiro ou março, dando-lhe uma chance de manobra. Com ajuda de Temer,
adiar-se-ia a decisão para 2017. Isso é o que lhe dói: a ingratidão de quem se
beneficiou com seu trabalho.
Cunha é um planejador detalhista, estudioso; como o diabo, sabe mais
pela experiência que por seus outros atributos. Mas não imaginava que quem se
beneficiou com seu trabalho quisesse tudo, menos tê-lo a seu lado. É sabido
demais para não ser perigoso. Liquidado, é mais seguro. E não conhecia a frase
definitiva do sábio general De Gaulle: “A ingratidão é uma das maiores virtudes
de que deve ser dotado um estadista”.
A mão que afaga
Os dois títulos destas duas notas estão num poema notável, Versos
Íntimos, de Augusto dos Anjos, obrigatório para quem pensa em política:
Vês! Ninguém assistiu ao formidável/ enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera – / Foi tua companheira
inseparável! Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável/ Mora, entre feras, sente
inevitável/ Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!/ O beijo, amigo, é a véspera do
escarro,/ A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,/Apedreja essa mão vil que
te afaga,/ Escarra nessa boca que te beija!
Folha corrida
É um perigo esquecer os bons resultados da ingratidão. Mas é um
perigo, também, esquecer a força de retaliação de um aliado ferido.
Cunha se candidatou à Presidência da Câmara pelo PMDB, partido
aliado a Dilma. Ela tentou derrubá-lo, ele reagiu: fez passar algumas medidas
de alto custo, às quais Dilma se opunha. Quiseram cassá-lo, e ele deixou claro
que, se o PT votasse por sua cassação, ele movimentaria o pedido de impeachment
que estava parado em sua mesa. O PT votou contra ele, ele liberou o
impeachment.
Dilma e Cunha caíram juntos.
A mão que apedreja
Segundo o jornal Valor, Cunha disse a seus advogados que quer falar.
Um dos advogados, Marlus Arns, já intermediou processos de delação premiada.
OK, ele pode deixar mal vários deputados do baixo clero, mas isso não lhe daria
o que quer: que os promotores esqueçam sua mulher e sua filha.
Já o colar de alho, a estaca de madeira, a água benta e a terra
consagrada que liquidariam Michel Temer, já isso vale muito mais.
Passarinho que come pedra
O noticiário de hoje em dia fala do medo que muitos parlamentares
têm de eventual delação de Cunha. Que é que esse povo andou fazendo para ter
tanto medo de um deputado que foi deposto, cassado e está preso?
O CÍRCULO VERMELHO MOSTRA O ANEL (O GLOBO) |
O anel de
brilhantes
Lembra de Fernando Cavendish, da empreiteira Delta, primeiro-amigo
do governador fluminense Sérgio Cabral? Agora é ele que delata. Dizem que
atinge PMDB e PSDB, cita-se o senador Aloysio Nunes e o governador goiano
Marconi Perillo. Mas a melhor história é de Sérgio Cabral. Conta Cavendish que
Cabral e ele passeavam por Monte Carlo quando Cabral parou em frente a uma
joalheria finíssima, Van Cleef & Arpels. “Amanhã”, disse Cabral, “é
aniversário de Adriana [sua esposa, Adriana Ancelmo] e preciso ver um
presente”. Entraram e uma funcionária trouxe, já embalado, um anel de ouro
branco e brilhantes. E ficou claro que quem pagaria a conta, uns R$ 800 mil, seria Cavendish. Ilustrando
a história, foto de Adriana Ancelmo com o anel, recibo e nota em nome da Delta.
Arrasador.
Nenhum comentário:
Postar um comentário