A HORA DO VOTO FACULTATIVO
Convencer o eleitor a votar é parte do processo.
O melhor argumento do governante é
não decepcionar quem votou nele
POR JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
PORTAL DO ESTADÃO
30/10/2016 – 20h05
Do mesmo modo como cresceram os votos brancos e nulos, voltou a
aumentar a proporção dos eleitores brasileiros contrários à obrigatoriedade do
voto. Segundo pesquisa nacional do Ibope, divulgada aqui com exclusividade,
desde 2010 cresceu de 51% para 54% a taxa daqueles que são contra o
voto obrigatório. É a mesma proporção que havia sido encontrada pelo Ibope dez
anos atrás.
Diante do crescimento em 2016 dos votos brancos e nulos e do aumento
da abstenção (embora em grande parte provocado pela desatualização do cadastro
eleitoral, que inclui muitos mortos), há o temor de que o fim da
obrigatoriedade de votar viesse a diminuir a representatividade da democracia
brasileira. No limite, arriscaria a sua legitimidade, por causa da chance
teórica de os governantes serem eleitos pela minoria da minoria.
Porém, a pesquisa Ibope revela também que nada menos do que 62% dos eleitores brasileiros dizem que
iriam votar mesmo que não fossem obrigados. Mais importante: essa taxa cresceu
13 pontos em comparação a 2014. É o segundo maior valor da série histórica do
Ibope, menor apenas do que o de outubro de 2010, quando a situação econômica do
Brasil e a popularidade dos governantes estava muito acima da sua média
habitual.
Nem mesmo a insatisfação da população brasileira com a classe
política fez diminuir o desejo voluntário de votar. Ou seja, a maioria absoluta
dos brasileiros é contra o voto obrigatório mas se diz disposta a participar da
eleição por vontade própria.
Os 62% encontrados pelo
Ibope estão acima da taxa de comparecimento em todas as eleições presidenciais
nos EUA desde 1960. Na reeleição de Barack Obama, por exemplo, só 55% dos norte-americanos em idade de
votar votaram. A taxa projetada pelos brasileiros é próxima ao comparecimento
às urnas nas últimas eleições na Espanha, Alemanha e Reino Unido.
Além da representatividade e da legitimidade, há outra questão
relevante: a abstenção e o voto de protesto não são equânimes. Em São Paulo, no
primeiro turno, a periferia pobre que costumava votar em candidatos petistas se
absteve ou invalidou seu voto com mais intensidade que o centro antipetista.
Se o voto fosse tornado facultativo no Brasil, qual o impacto que
isso teria sobre o resultado da eleição? Quem seria mais beneficiado ou
prejudicado? A resposta a essa pergunta é – claro – especulativa. Mas,
baseando-a no perfil de quem diz que compareceria à urna mesmo sem ser
obrigado, pode-se esperar que candidatos e partidos com eleitorado mais
escolarizado, menos pobre e concentrado nas pequenas cidades se sairiam melhor.
Nos municípios com até 50 mil habitantes, 69% dizem que votariam
mesmo se o voto fosse facultativo – contra 58% nas cidades com 500 mil
habitantes ou mais. A taxa cai para 52% entre os moradores dos municípios
periféricos das metrópoles. Dos que cursaram até a 4ª série, 59% dizem que
votariam mesmo se não fossem obrigados, contra 73% de quem fez faculdade. A
diferença entre mais ricos e mais pobres é de 11 pontos: 71% a 60%.
Levando-se em conta o partido de preferência do eleitor, o PT teria
hoje mais a perder com o fim do voto obrigatório do que PMDB e PSDB: 62% dos
petistas dizem que votariam mesmo se não fossem obrigados, contra 72% dos
peemedebistas e 79% dos tucanos. Mas esses simpatizantes são só um terço do
eleitorado. Quem menos diz que apareceria para votar voluntariamente são os
eleitores sem preferência partidária. Mesmo assim, 54% votariam.
O voto facultativo não seria neutro no Brasil como não é nos EUA.
Lá, os democratas costumam precisar se empenhar mais que os rivais para seus
eleitores irem votar. Mas nem isso é imutável. Em 2012, o baixo comparecimento
dos republicanos ajudou Obama. Convencer o eleitor a votar é parte do processo.
O melhor argumento do governante é não decepcionar quem votou nele.
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