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NÃO HÁ VAGAS
O
preço do feijão
não
cabe no poema. O preço
do
arroz
não
cabe no poema.
Não
cabem no poema o gás
a
luz o telefone
a
sonegação
do
leite
da
carne
do
açúcar
do
pão
O
funcionário público
não
cabe no poema
com
seu salário de fome
sua
vida fechada
em
arquivos.
Como
não cabe no poema
o
operário
que
esmerila seu dia de aço
e
carvão
nas
oficinas escuras
-
porque o poema, senhores,
está
fechado:
“não
há vagas”
Só
cabe no poema
o
homem sem estômago
a
mulher de nuvens
a
fruta sem preço
O
poema, senhores,
não
fede
nem
cheira
![]() | |
ILUSTRAÇÃO: FRAGA |
TRADUZIR-SE
Uma
parte de mim
é
todo mundo:
outra
parte é ninguém:
fundo
sem fundo.
Uma
parte de mim
é
multidão:
outra
parte estranheza
e
solidão.
Uma
parte de mim
pesa,
pondera:
outra
parte
delira.
Uma
parte de mim
almoça
e janta:
outra
parte
se
espanta.
Uma
parte de mim
é
permanente:
outra
parte
se
sabe de repente.
Uma
parte de mim
é só
vertigem:
outra
parte,
linguagem.
Traduzir-se
uma parte
na
outra parte
-
que é uma questão
de
vida ou morte -
será
arte?
ILUSTRAÇÃO: BAPTISTÃO |
NOVA
CANÇÃO DO EXÍLIO (*)
Minha amada tem palmeiras
Onde cantam passarinhos
e as aves que ali gorjeiam
em seus seios fazem ninhos
Ao brincarmos sós à noite
nem me dou conta de mim:
seu corpo branco na noite
luze mais do que o jasmim
Minha amada tem palmeiras
tem regatos tem cascata
e as aves que ali gorjeiam
são como flautas de prata
Não permita Deus que eu viva
perdido noutros caminhos
sem gozar das alegrias
que se escondem em seus carinhos
sem me perder nas palmeiras
onde cantam os passarinhos
***
***
Ferreira
Gullar, pseudônimo de José Ribamar Ferreira (São Luís, 10 de setembro de 1930 –
Rio de Janeiro, 4 de dezembro de 2016), foi um escritor, poeta, crítico de
arte, biógrafo, tradutor, memorialista e ensaísta brasileiro. Um dos fundadores
do neoconcretismo, Gullar é considerado um dos maiores escritores brasileiros
do século 20.
Ganhou
o concurso de poesia promovido pelo Jornal
de Letras com seu poema "O
Galo" em 1950. Recebeu também os prêmios Molière e Saci, além de
outros do teatro em 1966, com “Se correr
o bicho pega, se ficar o bicho come”, considerada uma obra prima do teatro
moderno brasileiro.
Em
2002, foi indicado por nove professores dos Estados Unidos, do Brasil e de
Portugal para o Prêmio Nobel de
Literatura. Em 2007, seu livro “Resmungos”
ganhou o Prêmio Jabuti de melhor
livro de ficção do ano. O livro, editado pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, reúne crônicas de Gullar publicadas
no jornal Folha de S. Paulo no ano
de 2005. Foi considerado pela Revista
Época um dos 100 brasileiros mais influentes do ano de 2009.
Em
2010, recebeu o prêmio Camões. No mesmo
ano, foi contemplado com o título de Doutor Honoris causa, na Faculdade de
Letras da UFRJ.
Em
20 de outubro de 2011, ganhou o Prêmio Jabuti com o livro de poesia “Em Alguma Parte Alguma”, que foi
considerado "O Livro do Ano" de ficção.
Ferreira
Gullar tomou posse na Academia Brasileira
de Letras, em dezembro de 2014.
FONTE:
WIKIPÉDIA
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