CÉU DE BRIGADEIRO? (FOTO: ARQUIVO GOOGLE) |
PARA MICHEL TEMER, GOVERNO MERECE
CONGRATULAÇÕES PELO MUITO QUE JÁ FEZ
Alçado ao Planalto nas pegadas de manifestações épicas
contra a corrupção, Temer comete o erro primário
de imaginar que pode governar de costas para a ética
POR JOSIAS DE SOUZA
UOL – 20/12/2016 | 04:21
Michel Temer está chateado. Acha que seu governo não vem obtendo o
reconhecimento que merece. Um auxiliar do presidente conta que ele se considera
injustiçado pelo pedaço da imprensa que o imprensa. Herdou de Dilma o caos,
gosta de realçar. Poderia resignar-se. Mas prefere encarar a conjuntura com
coragem, não cansa de repetir. Enumera os feitos obtidos em escassos sete
meses: a PEC do teto dos gastos, a troca do modelo de exploração do pré-sal, a
deflagração da reforma do ensino médio, o encaminhamento da proposta de ajustes
na Previdência. Temer está satisfeito consigo mesmo. Lamenta que os resultados
não aparecem do dia para a noite. Mas avalia que todos têm o dever de
reconhecer que as coisas melhoraram.
Num instante em que perde a pouquíssima popularidade de que
dispunha, Temer cogita enfrentar as panelas no horário nobre da tevê, para
demonstrar à plateia que seu governo é entusiasmante. Muitos brasileiros,
depois de ouvir o pronunciamento do presidente talvez resolvam viver no país
que ele descreve com tanta convicção, seja ele onde for. No país de Temer, pelo
menos, o presidente não é alvejado por denúncias, seus auxiliares não são
suspeitos de corrupção, seus líderes no Congresso não respondem a inquéritos,
sua base legislativa não está apodrecida, seu partido não cheira mal, não
existe Odebrecht, as ruas não roncam e 2017 será próspero.
Temer faz como o avestruz: para não tomar conhecimento do pedaço
cinza da realidade, enfia a cabeça nos seus autocritérios. O brasileiro vive um
daqueles momentos em que entender o que se passa depende da predisposição de
cada um. Ou o país continua na rota do caos ou tomou a trilha da redenção, você
decide. Temer é otimista por obrigação. Sua claque é otimista por hipnose. Seus
aliados são otimistas por intere$$e. Os 13% que avaliam seu governo como ótimo
ou bom são otimistas na esperança de que as medidas do governo sejam boas, pois
não há outras. E os 63% que pedem a renúncia de Temer antes do Natal desconfiam
que quem é otimista trocou a razão pela comodidade de uma confiança cega.
Alçado ao Planalto nas pegadas de manifestações épicas contra a
corrupção, Temer comete o erro primário de imaginar que pode governar de costas
para a ética. Ao enaltecer suas realizações sem atentar para o lodo lhe toca o
bico do sapato, o presidente está, no fundo, pedindo aos brasileiros que façam
como ele: se finjam de bobos pelo bem do Brasil. Temer sabe que a delação coletiva
da Odebrechet, trancada na sala-cofre do Supremo Tribunal Federal, transforma
sua administração numa superestrutura pendurada no ar. Mas não convém
comprometer a salvação do país por algo tão politicamente supérfluo como a
moralidade. Enquanto der, o melhor é fingir que nada aconteceu. Fica combinado
que os 800 depoimentos dos 77 delatores da Odebrecht não existem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário