FOTOGRAFIA: CLÓVIS CAMPÊLO |
NO MORRO DA
CONCEIÇÃO
(Por Clóvis
Campêlo) Transformado em santuário, esperava encontrar
o Morro da Conceição invadido pelo gentio. Estava quase vazio. Talvez eu tenha
ido no dia certo (8 de dezembro) mas na hora errada (no começo da tarde). No
auge do meu desapontamento, cheguei a pensar que aquela tradição religiosa do
povo recifense decaía. Ledo engano, porém. Mais tarde, vejo na televisão a
multidão acompanhando a imagem da Santa, vinda do Recife Antigo na direção do
Morro. Entendi, então, que, descuidado na minha falta de fé, havia errado o foco.
No Morro, sigo em frente até chegar aos pés da imagem e
deslumbrar-lhe a beleza. Vista de qualquer um dos lados, encanta. E, sob o
milagre da multiplicação e da produção comercial em série, alimenta a fé do
povo. Ao mesmo tempo, alimenta a alma e o comércio da fé. As barraquinhas,
antes restritas ao comerciantes autônomos, agora, em parte, também são mantidas
pela própria Igreja. Nada mais justo, já que viemos do capital e ao capital
retornaremos. Como disse o poeta, a grana ergue e destrói coisas belas.
Alimentadas a fé e a alma, restaria o corpo. Para a fraqueza física
dos pobres mortais, sopa com pão, tapioca com café e suco de laranja. Afinal,
ninguém é de ferro e a fome física pode se equiparar à fome de fé. Devemos,
portanto, cuidar dela e aplacá-la para conseguirmos manter a outra de pé.
Poderíamos até afirmar, com a convicção dos incrédulos, que são fomes
inseparáveis.
Subir o Morro, porém, não é fácil quando se carrega consigo mesmo a
dívida de alguma promessa feita. Hoje, muitos poucos se arriscam a subir o
Morro nadando, de joelhos ou com tijolos nas cabeças para pagar alguma graça
alcançada. Antes, essa movimentação era bem maior.
Assim, em dia de Nossa Senhora da Conceição, o Morro nos oferece ao
mesmo tempo exemplos de fé religiosa, de gratidão popular e de oportunismo
comercial. Até mesmo a necessidade fisiológica do povo de Deus, que não queira
se sujeitar aos fétidos banheiros químicos oferecidos pela municipalidade, pode
custar alguns trocados a mais. Mas, diante da fé que sempre removeu montanhas,
isso não significa absolutamente nada.
Recife, dezembro 2016
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