CUNHA (IMAGEM: ARQUIVO GOOGLE) |
CÚPULA NO PARANÁ
Eduardo Cunha aposta no Supremo para trocar cativeiro
de Curitiba pela aprazível residência na Barra, com jurisprudência
benéfica a outros políticos acusados de corrupção
POR JOSÉ CASADO
PUBLICADO EM “O GLOBO”
13/12/2016
Seria uma reunião de cúpula, não fossem as circunstâncias: Eduardo
Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio, recém-chegado;
Antonio Palocci, ex-ministro dos governos Lula e Dilma; Marcelo Odebrecht,
ex-presidente da Odebrecht; e “Leo” Pinheiro, ex-presidente da OAS. O mais
velho, Pinheiro (65 anos), é quem mais incomoda vizinhos com disfunções. Está
condenado a 26 anos, em regime fechado.
O mais jovem, Odebrecht (48 anos), é quem melhor conhece aquelas
celas apertadas (3m x 4m). Por acordo, sua pena caiu de 19 para dez anos. Fica
preso até a primavera de 2017. O mais introspectivo é Cunha (58 anos), acusado
de suborno num obscuro negócio da Petrobras na África. Devora o tempo lendo
peças de processos entre a bancada e a cama de alvenaria, de onde enxerga,
pelas grades, pedaço do corredor vazio e os vizinhos de frente.
Depois de 54 dias na cadeia, ele espera ganhar do Supremo um habeas
corpus que lhe permita sair do cativeiro de Curitiba e voltar à aprazível
residência na Barra, no Rio. Apostava em maioria na segunda turma do Supremo,
composta pelos juízes Gilmar Mendes (presidente), Teori Zavascki (relator),
Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. Tinha expectativa de vencer,
na sessão de hoje, por três votos a dois.
Ontem à noite, porém, o caso foi retirado de pauta. Agora, é
provável que o pedido de Cunha seja examinado durante o recesso do tribunal,
que começa na próxima terça-feira, 20, e vai até fevereiro. A decisão seria de
um juiz-plantonista. Um desfecho favorável a Cunha é aguardado em Brasília como
consequência natural do “entendimento” da semana passada, quando o Supremo
evitou expulsar Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado — até agora,
ele só está excluído da linha sucessória.
Esse acordo — futuro acórdão — demonstra que juízes de cortes
superiores são políticos de toga. Um dos artífices foi Gilmar Mendes. Estava em
Estocolmo, a dez mil quilômetros de distância, mas exauriu-se em telefonemas ao
Supremo e ao Senado com sugestões, algumas recebidas e até aclamadas pela
defesa do senador-réu.
O interesse na liberação de Cunha é de quem teme efeitos de sua
potencial delação combinados aos da Odebrecht, num ambiente de instabilidade
marcado por aumentos na rejeição ao presidente (20 pontos em cinco meses) e na
desconfiança sobre o rumo da economia. O governo decodificou a mensagem de
Cunha nas 41 perguntas que endereçou ao presidente Michel Temer, sua testemunha
de defesa. O juiz Sérgio Moro censurou 21 delas, por “inapropriadas” ao
processo.
Entre as proibidas, algumas se referiam ao eventual conhecimento de
Temer sobre crimes na Petrobras. Outras indicavam suposto fluxo de dinheiro de
fornecedores da estatal para “eleição de Vossa Excelência ou do PMDB”. Cunha
citou encontros no 377 da Rua Bennett e 470 da Avenida Antônio Batuíra — casa e
escritório paulistano de Temer. O lenitivo político-judicial a Cunha, se bem-sucedido,
seria aplicável a causas análogas.
Beneficiaria outros acusados de corrupção. Principalmente, chefes
políticos insones com a aflição do amanhã, quando alguém pode aparecer na porta
de casa gritando:
— Vem pra cá. Você ganhou viagem grátis para reunião de cúpula com
Palocci, Zé Dirceu e Cabral no Paraná.
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