PLENÁRIO DO STF: ALI, NINGUÉM SE ENTENDE |
AS SAFENAS DA REPÚBLICA
POR JOÃO BOSCO RABELLO
EM POLÍTICA NO AR
15/12/2016
Não se sabe ainda o que inspirou o deputado Bolsonaro, filho, a
questionar a votação de 400 deputados, mas a liminar do ministro Luis Fux,
determinando à Câmara que volte à estaca zero no exame do chamado pacote
anticorrupção é mais um capítulo de um confronto aberto.
Fux justifica sua decisão com uma suposta transgressão da Câmara a
regras que disciplinariam a tramitação de projeto de iniciativa popular,
recorrendo a uma analogia com as Medidas Provisórias, que não podem ser
utilizadas para transitar matérias estranhas ao seu conteúdo original.
Há, no entanto, diferença: MPs entram em vigor logo após dar entrada
no Legislativo, têm objetivo específico e urgência explicitada e justificada e
prazo de vigência.
Como passaram a ser usadas para os chamados “contrabandos” – artigos
nela inseridos com outra finalidade -, foi preciso fechar essa porta.
Outras propostas, que seguem tramitação normal, são admitidas,
debatidas, emendadas e votadas, não têm a mesma característica.
Com sua decisão, Fux repete o gesto monocrático de Marco Aurélio
Melo, em matéria que deveria ser submetida ao plenário – pela sua gravidade e
potencial de agravar a crise já inegável entre Judiciário e Legislativo.
Os atores tiraram a maquiagem e abandonaram o script da
independência entre os poderes. Decididamente, em ações individuais, dois
ministros do STF já arriscaram liminares que trafegam na fronteira da
interferência de um Poder em outro.
O ministro justificou a liminar – portanto, a decisão monocrática -,
à urgência determinada pela tramitação da matéria já no Senado. Admite, então,
que era preciso interrompê-la.
Mas embasa a decisão em argumento polêmico cuja síntese é a de que
projetos de iniciativa popular não podem ser alterados no seu objeto. Expõe-se,
assim, à leitura de parcialidade.
JOÃO BOSCO RABELLO É JORNALISTA |
Não foi o que ocorreu com a lei da Ficha Limpa, que sua liminar, se
consolidada em decisão colegiada, revogará na prática. Mais: nada impede que o
Congresso faça sua versão própria para abuso de autoridade.
A decisão de Fux pode, inclusive, gerar esse efeito por reação
corporativa, ampliando mais ainda a crise. No Congresso é majoritária a
convicção de que o Judiciário não resiste a uma devassa nas folhas salariais.
Por fim, produz o mesmo efeito de Marco Aurélio Melo com a liminar
que pretendeu destituir o presidente do Senado: a divisão do Supremo, como
mostra a primeira reação irônica do ministro Gilmar Mendes, sugerindo que feche
o Congresso e entregue a chave à equipe da Lava Jato, já que a origem da lei
anticorrupção é o Ministério Público.
À tarde, o ministro Teori Zavascki devolveu ao Procurador Geral,
Rodrigo Janot, a nova denúncia contra Renan Calheiros. Nem a recebeu, porque
percebeu que pouco ou nada avançara em relação à versão anterior, para a qual
pedira prorrogação das investigações.
Nota-se aí uma coincidência: o açodamento do Ministério Público e do
Judiciário em produzir situações destinadas a impedir que o Legislativo
consolide intenções já manifestadas de restringir-lhes o poder.
Marco Aurélio atropelou o tempo para apear Renan do Poder antes que
seus pares concluíssem um julgamento que poderia viabilizá-la de forma
incontestável – e às vésperas de votação da emenda que limita os gastos
públicos, refutada por parte do Judiciário.
Janot apressou-se em mandar para o STF nova denúncia contra Renan
sem consistência que a tornasse irrefutável.
E Fux repete o padrão, cancelando uma votação amplamente majoritária
da Câmara dos Deputados, de forma, no mínimo, polêmica. Consolida-se a máxima
de que cada ministro é um STF. (*)
Nesse momento, os dois poderes estão metidos em um tiroteio na
fronteira que os separa.
Com a economia em estado falimentar, nem ponte para o futuro e nem
pinguela – a República precisará de safenas.
(*) LEIA TAMBÉM O ARTIGO DE J. R. GUZZO
Como
os poderes executivo e legislativo foram desmoralizados até o seu
último átomo pela corrupção, a incompetência e a vadiagem, o STF cresceu
de uma maneira doentia, e completamente desproporcional à sua
capacidade de gerir conflitos.
Por J. R. Guzzo
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