quinta-feira, 10 de novembro de 2016

PÁ DE CAL NA CANDIDATURA DO DOUTOR INÁCIO



Resultado de imagem para imagens tchau, querido



Avessos a políticos, mas adeptos de toda e qualquer boca-livre, os fregueses do Bar do Carneiro aguardavam ansiosos o meio-dia daquele domingo, antevéspera das eleições municipais. Afinal, o churrasco estava garantido. Doutor Inácio – é dessa forma como gosta de ser chamado, embora só disponha do diploma de bacharel barrado nos exames da OAB – era candidato a mais um mandato de vereador. Estava no terceiro. Durante doze anos consecutivos, não perdeu uma chance sequer de provar – e comprovar – sua inutilidade como homem público.

Paparicado pelos presentes, o candidato cumpriu mais que o combinado com o dono do bar: além da carne e do pão, passou a pagar cachaça e cerveja para os possíveis eleitores, que não se cansavam de enaltecer – da boca para fora, evidentemente – as benfeitorias que ele jamais trouxera para Vila Invernada e região. Eleição difícil, aquela. Povo cada vez mais empobrecido, gente mais descrente que nunca. Doutor Inácio abriu a carteira, mas, por prudência, economizou na falação palanqueira. A rigor, limitou-se a elencar feitos não feitos e a omitir seus malfeitos. Mas, por aquela, ele não esperava: o Velho Marinheiro, que não tocara no churrasco e bebera com recursos próprios, pediu a palavra:

-- Vereador Inácio: minha neta Irene fez uma pesquisa sobre sua atuação na Câmara Municipal. O senhor, de fato, foi o que mais apresentou projetos de lei: 136, até ontem – disse nosso Lobo do Mar, com ares de quem colocaria uma pá de cal nas pretensões do candidato.   

-- Obrigado, pela lembrança, caro eleitor. Muito oportuna. O senhor é um cidadão consciente.

-- Não se anime. Jamais serei seu eleitor. Dos 136 projetos, não se aproveita um. A maioria é autorizativo. Ou seja: o senhor autoriza o prefeito a fazer o que ele não está impedido de fazer. São, portanto, propostas inúteis. Os demais são nomes para ruas, praças, vielas, viadutos e pinguelas. Além disso, quem quer se esconder de Vossa Excelência deve ir ao plenário no horário das sessões. O senhor raramente está por lá. Se fosse pouco, ainda é acusado de tomar parte dos salários dos funcionários que nomeou. Sua folha corrida é extensa.  

-- Que absurdo – limitou-se murmurar o candidato, afetando indignação.

De barrigas e caras cheias, todos foram saindo de fininho. Mas Doutor Inácio, que, dias depois, seria derrotado nas urnas, não ficou para apagar as luzes. (OS - NOVEMBRO - 2016)


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O Velho Marinheiro foi logo deixando claro: 
"Não espero nada de ninguém. Se puder ajudar, ajudo. 
Se não puder, aviso: não posso fazer nada por você, 
vá procurar adjutório em outra freguesia."
Por Orlando Silveira, em "O príncipe do samba-canção" http://orlandosilveira1956.blogspot.com.br/2016/11/ananias-o-principe-do-samba-cancao.html#comment-form

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