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AS ILUSÕES DAS ELEIÇÕES
Quem rotula PSDB e PMDB de centro-direita acredita
em contos de fadas e bruxas nos quais Lula,
insubstituível líder do PT, é esquerdista
POR JOSÉ NÊUMANNE
ESTADÃO – 02/11/2016
O principal derrotado nas eleições municipais de outubro de 2016 foi
o Partido dos Trabalhadores (PT). E com ele afundaram nas urnas seus sucedâneos
e tradicionais aliados de esquerda: de Rede, PSOL e PCdoB a nanicos
revolucionários – os de centro-esquerda e os mais extremados.
Isso quer dizer que a centro-direita venceu a disputa, levando em
conta estatísticas avassaladoras do gênero: 80% das prefeituras do País foram conquistadas por legendas, das
gigantes às mínimas, todas componentes da base de apoio do governo-tampão de
Michel Temer? Ou, ainda, o maior partido da oposição nos desgovernos petistas
de Lula e Dilma, o PSDB, ganhou 863,
ou seja, 25% dos pleitos, um recorde
histórico? Nada disso!
Acreditar em tal lorota – ou na análise oportunista e apressada do
advogado, empresário e político Eliseu Padilha, ministro-chefe da Casa Civil do
governo federal, de que os eleitores derrotaram nas urnas a hipótese
estapafúrdia do “impeachment sem crime é golpe” – é dar alguma razão a quem
ainda insiste nessa total tolice.
Quem rotula PSDB e PMDB de centro-direita acredita em contos de
fadas e bruxas nos quais Lula, insubstituível líder do PT, é esquerdista. Os
tucanos, atarantados sócios da maior legenda que se opôs aos 13 anos, 4 meses e
12 dias sob o ex-sindicalista e a ex-guerrilheira, são farinha do mesmo saco de
que se nutriu o partido que foi comandado por Ulysses Guimarães. Foram
produzidos na luta gloriosa contra a ditadura militar e civil, esta, sim, de
direita, que promoveu o milagre econômico e a repressão brutal dos anos 60 a
80. Mas foram separados na feira em que se puseram à venda nas vicissitudes da
democracia que sucedeu ao arbítrio.
“Na verdade, Freixo foi derrotado porque sua tolerância
com traficantes e vândalos mascarados fere mais
a suscetibilidade do pobre, que não pode sair da favela onde nasceu”
Ao contrário do que reza a doutrina esquizofrênica da esquerda,
dominante nas escolas e nos palanques, o autoritarismo não ruiu aos pés dos
“heróis” da guerra suja, mas da prática democrática da sociedade e dos
parlamentos liderados pela oposição civil, mesmo sob dura ameaça permanente.
O longo processo que depôs a quarta gestão federal petista nunca foi
contaminado em um segundo que fosse pelo vício da ilegitimidade. A teoria do
“gópi” – apud senadora Fátima Bezerra
(PT-RN) – nunca sequer foi levada em conta pelo cidadão comum na hora de votar
em seu prefeito. O engano de Padilha nem precisa ser negado por pesquisas de
opinião que constatam índices massacrantes de impopularidade de seu chefe no
Palácio de Planalto. Pois esta é percebida, por qualquer brasileiro de posse
das faculdades mentais, em casa, no trabalho e nas ruas. Mas, como ficou rouca
de insistir Dilma, impopularidade não tira legitimidade de presidente nenhum. E
a maioria que a sufragou nele votou, ora bolas!
Das profundezas de sua tumba o Conselheiro Acácio, criado por Eça de
Queiroz, mandou avisar que os vencedores das eleições municipais, a salvo de
todas as ilusões, foram os candidatos que tiveram mais votos. Em São Paulo,
João Doria precisou muito de Geraldo Alckmin para afastar Andrea Matarazzo da
legenda tucana, exilando com ele os figurões Fernando Henrique, José Serra e
Alberto Goldman. Mas o governador paulista não contribuiu com os votos
necessários para a vitória nas urnas.
A eleição folgada em segundo turno do ex-bispo (isso existe?) da
Igreja Universal Marcelo Crivella, no Rio, não representa uma adesão em massa
da maioria católica dos cariocas às barbas do pretenso profeta Edir Macedo. Os
mapas eleitorais da cidade que já foi maravilhosa desvendam um triunfo obtido
na periferia miserável sobre os bairros dos abonados que, isolados, elegeriam
Marcelo Freixo. Na verdade, este foi derrotado porque sua tolerância com traficantes
e vândalos mascarados fere mais a suscetibilidade do pobre, que não pode sair
da favela onde nasceu, do que a segurança do rico, apto a comprar a própria paz
com uma parte ínfima da mais-valia a que tem acesso.
“Foi necessário o holerite desaparecer em todos os municípios
para os brasileiros notarem quanto os empobrece
o enriquecimento dos políticos”
Segurança é uma senha evidente para definir o voto majoritário de
outubro, mas não é a única. Nem a principal. O sinal disso foi dado pela
transformação do agressivo cinturão vermelho que cingia a Grande São Paulo por
um diáfano diadema azul. Nunca antes na História deste país, no ABC, berço do
sindicalismo autêntico, do PT e do carisma de Lula, bandeiras rubras foram
enroladas nas festas de vitórias municipais. A região teve a terrível
oportunidade de testemunhar que o poder nas mãos dos sindicalistas e os cofres
públicos escancarados pela renúncia fiscal às montadoras não poderiam resultar
em nada diferente do desemprego em massa, que esvaziou as despensas dos lares
operários. A fuga das estrelas encarnadas das ruas do ABC paulista é o melhor
símbolo da consciência do eleitorado de ter sido vitimado pela corrupção, pela
inépcia e pelo aparelhamento petista da máquina pública, que resultaram na
crise econômica, na quebradeira das empresas e na tragédia do desemprego
galopante.
Foi necessário o holerite desaparecer em todos os municípios para os
brasileiros notarem quanto os empobrece o enriquecimento dos políticos, cujo
furto fica mais cruel quando se acompanha do desencanto com o lorotário
ideológico.
Por incrível que pareça, a pré-racionalidade do eleitorado (apud Mauro Guimarães) também cobrou
duramente do maior adversário de Lula e principalmente Dilma, o tucano mineiro
Aécio Neves, que perdeu a eleição em Belo Horizonte para um cartola de futebol
que disse que “roba” (sic), mas não
pega propina. Neto de Tancredo Neves, que avisava sabiamente que ninguém se
elege presidente se não for capaz de unir o próprio berço, Aécio trouxe agora à
tona a mentira de que em 2014 teria sido derrotado no Nordeste, mas foi vencido
mesmo em Minas Gerais.
Agora disputará a indicação do partido com Geraldo Alckmin, que
elegeu um prefeito em cada quatro cidades paulistas, sendo uma delas a maior de
todas. Nesta era cibernética até o castigo “avoa” nos ares.
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