Getúlio, por Sponholz |
INSPIRAÇÕES
GOLPISTAS
Getúlio
orientava-se pela premissa de que os fins
justificam
os meios, parâmetro usual entre populistas,
extremistas
e fundamentalistas. Não tinha limites
Por Mary Zaidan
Blog do Noblat
12/11/2017 - 01h25
“Tanto os velhos partidos como os novos, em que os velhos se
transformaram sob novos rótulos, nada exprimem ideologicamente, mantendo-se à
sombra de ambições pessoais ou de predomínios localistas, a serviço de grupos
empenhados na partilha dos despojos e nas combinações oportunistas em torno de
objetivos subalternos”.
Dita há
exatos 80 anos, a frase cabe como luva aos dias de hoje. Com um agravante de
arrepiar: com ela, o então presidente Getúlio Vargas justificava o fechamento
do Congresso Nacional, ato primeiro do Estado Novo, golpe de 10 de novembro de
1937.
Com o poder
de cassar mandatos, suspender eleições, vigiar e censurar a imprensa, prender
comunistas – entre eles o jovem escritor Jorge Amado --, a ditadura Vargas
prosperou com a conjunção demoníaca de economia em frangalhos e ausência de
lideranças capazes de dialogar com a população pobre e descrente.
Ambiente
similar ao que vemos hoje, ainda que as condições objetivas de agora, na
economia, e, especialmente, da maturidade institucional do país, estabeleçam e
evidenciem a distância histórica.
Líder inconteste
da extrema direita nacionalista, Getúlio misturou seu imenso carisma a
modelagens fascistas que tanto sucesso faziam na Itália de Benito Mussolini, na
Espanha franquista e na Alemanha nazista.
Mas, ao
contrário da ojeriza que esses ditadores provocam em seus países de origem e em
todo o mundo democrático, Getúlio virou ícone de partidos ditos da esquerda
nacional, que deram a ele o status de divindade – o pai dos pobres. Até os
neocomunistas tupiniquins o vangloriam.
Mary Zaidan é jornalista |
Por
ignorância, má-fé, ou ambos, esse segmento apagou da história o golpismo
getulista e pesou as tintas no criador da Petrobras e da Consolidação das Leis
do Trabalho, editada por decreto, em 1943, com inspiração na Carta del Lavoro (1927), da lavra de
Mussolini.
Pode ser
coincidência – aquela que dizem não existir – ou traquinagem da história o fato
de as novas leis trabalhistas, desta vez aprovadas pelo Congresso Nacional,
terem entrado em vigor no sábado, um dia depois do golpe octogenário.
Presidente
do país de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954, único período para o qual foi eleito,
Getúlio orientava-se pela premissa de que os fins justificam os meios,
parâmetro usual entre populistas, extremistas e fundamentalistas. Não tinha
limites. E demonstrou isso até na dramaticidade de sua morte.
Ainda hoje
sua herança é disputada a tapa. Já foi pendenga entre o PDT e o PTB no período
da redemocratização, está no discurso de todos os matizes, antagoniza e une
extremos.
Sem tirar
nem pôr, Getúlio cabe em qualquer manequim.
Lula,
outrora reencarnação, e que já teria superado Getúlio segundo a sua tropa, usa
e abusa das “conquistas” dos anos 1940 nos palanques e da popularidade do
golpista que ele diz admirar. Na outra ponta, Jair Bolsonaro arrebata os
getulistas saudosos dos vínculos do ditador com os militares, com a extrema
direita e os anticomunistas.
Ambos
partilham outra adoração: o modelo Ernesto Geisel.
Bolsonaro
exibe a foto do general em sua sala e Lula elogia, com vigor, o modelo
nacional-desenvolvimentista do penúltimo presidente militar, aplicado ao
pé-da-letra por sua pupila Dilma Rousseff, com consequências nefastas para o
país: recessão e desemprego recordes.
Os dois –
Lula e Bolsonaro – também disputam aconselhamentos de Delfim Neto, ex-ministro
da Fazenda, Agricultura e Planejamento do regime militar.
Ainda que
pareça estranho ao paladar e irrite aos fundamentalistas de um lado e de outro,
Lula e Bolsonaro tentam cozinhar o público com os mesmos ingredientes: a unção
divina de ser o salvador da pátria, o falso moralismo e o apelo por
nacionalismo de ocasião. Usam e abusam do falseamento da História, dos exemplos
de Getúlio, Geisel e até JK. Tudo temperado por populismo barato.
Resta saber
se o eleitor vai engolir ou não essa gororoba.
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