FOTO: CLÓVIS CAMPÊLO |
O SOCIALISTA DA CONCÓRDIA
(Por Clóvis Campêlo) Segundo
o site da Fundaj, em artigo assinado pela pesquisadora Lúcia Gaspar, fica
explicado que a Rua da Concórdia, localizada no bairro de São José, teve o seu
nome nascido de uma disputa entre dois dos seus moradores, Manuel José e José
Fernandes. Cada um reivindicava o privilégio de ter o seu nome na rua. Em 1840,
por iniciativa do presidente do Conselho Municipal, Maciel Monteiro, 2º Barão
de Itamaracá, o impasse foi resolvido: lendo uma poesia de sua autoria,
intitulada A Concórdia, propôs aos contendores que a rua se chamasse Rua da
Concórdia, o que foi aceito por ambas as partes.Portanto, não há a menor
possibilidade de discórdia na Rua da Concórdia.
Nos
anos 60, durante muito tempo, a linha de ônibus Pina Rua do Sol, por ali
passava, levando a mim, estudante do Ginásio Pernambucano, antes de fazer o seu
terminal na Rua do Sol, ao lado da antiga Casa de Detenção do Recife, onde,
entre outros, foi prisioneiro o cangaceiro Antônio Silvino e o paraibano João
Dantas, assassino de João Pessoa, na época da sua morte, presidente da
província da Paraíba.
É
na Rua da Concórdia, também, onde mora o meu amigo Tuca Frazão, bem pertinho da
sede do Galo da Madrugada, onde no sábado de Zé Pereira, dia de desfile do
clube de máscaras, fazemos uma parada obrigatória. Ali, naquela residência
amiga, nos idos dos anos 70, curti muita batucada e algumas cachaçadas.
Também,
é no final da rua, ao lado da ponte de ferro que liga o bairro do São José ao
bairro da Boa Vista, que existe uma escultura magistral do abolicionista
Joaquim Nabuco. A obra é composta pela estátua do emitente homem público e por
várias outras estátuas representando negros libertos e agradecidos. Hoje, uma
dos negros que compõem o monumento teve o braço esquerdo arrancado e a mão
direita está sem os dedos. Parece que o povo não tem mesmo memória. A obra foi
inaugurada em 1915, com Joaquim Nabuco já morto, em comemoração às Leis do
Ventre Livre e dos Sexagenários.
Durante
algum tempo, a escultura de Quincas, o Belo, como também era conhecido,
destacou-se no noticiário local por conta de um enxame de abelhas africanas que
se alojou no seu ouvido esquerdo e que, vez por outra, colocava os incautos a
correr fugindo das suas ferroadas.
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Portanto,
em um lugar histórico e democrático como a Rua da Concórdia, não me causou
estranheza a camioneta acima, onde um lado estampava a figura do comandante
cubano Fidel Castro, e, do outro, a imagem de Ernesto Che Guevara, o
guerrilheiro argentino que um dia sonhou em libertar a América Latina do jugo
capitalista.
De
onde viria tal veículo? Qual o significado daquilo? Estaria ligada a algum
partido político de esquerda? Ou o seu proprietário seria simplesmente um
admirador retardatário daqueles homens?
Não
tive tempo de lhe perguntar isso. Nem mesmo consegui fotografar o lado oposto
da camioneta, onde Guevara ostentava o seu enigmático olhar. Mas, as barbas do
comandante foram fixadas no campo magnético da minha máquina Sony capitalista.
Afinal, fotografia hoje se faz assim, com magnetismos e oportunidades.
É
exultante, para o meu lado fotográfico e utopista, perceber no mundo (e mais
especificamente na cidade do Recife) identificações ideológicas e filosóficas.
Com
certeza, a mim, só resta efetuar seus registros.
Recife,
abril 2016
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