FREI DAMIÃO |
A MUDANÇA
(Por Violante Pimentel) Há
várias décadas, as santas Missões de Frei Damião de Bozzano chegaram a uma
conhecida cidade do interior do Rio Grande do Norte. Grandes multidões de fieis
acompanhavam as procissões pela madrugada, ouvindo as pregações do santo frade capuchinho,
como se estivessem ouvindo o próprio Jesus Cristo falando. Os matutos tinham
certeza de que Frei Damião era filho do Papa.
O
povo ouvia as palavras vibrantes do frade, e ficava assustado quando ele dizia
que os amancebados e as prostitutas iriam arder no fogo do inferno. As santas
Missões conseguiam realizar, na Igreja católica, casamentos coletivos, de
casais que viviam amasiados, faziam turnos de confissões masculinos e
femininos, batizados, crismas, e aos domingos havia a 1ª Comunhão, num ato
festivo.
Durante
um de seus sermões, Frei Damião anunciou que tinha recebido um
"abaixo-assinado", dos fieis que frequentavam a Igreja, pedindo-lhe
que exigisse que o prefeito da cidade determinasse o fechamento de um antigo
cabaré que havia no centro da cidade, ou a sua mudança para outro local.
O
próprio prefeito costumava frequentar o cabaré e, por demagogia, tratava as
meninas e a proprietária como suas amigas e eleitoras fieis. As beatas, os
idosos e as pessoas enfermas aprovaram a ideia imediatamente. No entanto, os
frequentadores do cabaré, as mulheres livres, alguns políticos e as prostitutas
ficaram preocupados com o destino que lhe seria dado.
Os
boêmios e frequentadores do cabaré ficaram revoltados com a proposta feita ao
prefeito José Percílio, que nunca fora homem de Igreja. Só ia mesmo à festa da
Padroeira, para fazer média junto aos eleitores. Apesar de não ter ouvido o sermão
de Frei Damião, um correligionário seu, logo depois da missa, correu até sua
casa e lhe passou o serviço completo. O homem
sentiu-se entre a cruz e a espada. Na prefeitura, José Percílio recebeu
a visita de um grupo de freiras franciscanas, do Colégio Medalha Milhagrosea, e
uma comissão de Mulheres da Ação Católica, para pressioná-lo a atender ao apelo
de Frei Damião. À noite, discretamente, José Percílio foi ao cabaré. Pediu a
opinião da proprietária, conhecida por Baronesa.
Sem
pestanejar, a veterana das "meninas" falou:
-
A mercadoria que nós vendemos, ela é procurada em qualquer lugar. Tanto faz ser
aqui ou na frente da prefeitura, pois os homens vem atrás de nós.
Violante Pimentel é procuradora
aposentada do Rio Grande do Norte
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Valeu
a palavra de Baronesa, e José Percílio saiu mais aliviado. As mais novas e mais
bonitas não queriam ficar tão longe do centro da cidade, porque nem todos os
fregueses tinham carro. Se o bordel ficasse longe, a clientela iria diminuir.
Algumas já pensavam até em fazer uma greve de sexo, cruzando as pernas contra
os correligionários do prefeito e até contra o mesmo. Uma conspiração se
instalava na cabeça das operárias do sexo.
Pouco
tempo depois, José Percílio comprou um terreno, na saída da cidade, e construiu
um bordel, com quartos para todas as "meninas", um salão de danças e
um bar.
Houve
a mudança, e logo a vida das prostitutas voltou ao normal.
Logo
que tomou conhecimento da atitude do prefeito, Frei Damião voltou à cidade e
fez uma procissão, indo da Igreja até à frente do novo cabaré, onde rezou uma
missa e rogou aos céus para que aquelas “infelizes mulheres” deixassem a vida
da prostituição, o mais breve possível, para evitar que ardessem no fogo do
inferno...
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