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O REBANHO
(Por Violante
Pimentel) Padre Amaro, há mais de dez anos, vigário de
uma paróquia do interior do Rio Grande do Norte, não se conformava com o alto
grau de adultério, praticado pelas senhoras da cidade. Cansado de ouvir sempre
as mesmas coisas, rogou às mulheres adúlteras, no confessionário, que não mais
pronunciassem as palavras “adultério” ou “traição”, substituindo-as pelas
expressões "eu toquei sanfona” ou “eu toquei sanfona novamente”.
A partir de então, quando havia confissão, o vigário chegava ao fim
do seu trabalho cansado de ouvir das senhoras as frases: “eu toquei sanfona” ou
“eu toquei sanfona novamente.”
As penitências impostas àquelas pecadoras, como a de rezar um
rosário (cinco terços) de joelhos, eram repetitivas. As ameaças de que suas
almas iriam arder no fogo do inferno, por ocasião do juízo final, de nada
adiantavam. As pecadoras, às vezes, chegavam a chorar, e juravam nunca mais
pecar. Mas não se corrigiam nunca.
Corria tudo bem na paróquia, apesar do rebanho trabalhoso, quando
houve um surto de dengue, sendo o padre Amaro vitimado pela dengue hemorrágica.
Houve uma verdadeira comoção na cidade. Todo o povo lamentou o triste
acontecimento, pois o vigário era muito querido.
Uma semana depois, os serviços da paróquia se normalizaram, com a
chegada do padre Bento, que viera substituir o pranteado vigário.
Depois de alguns meses à frente da paróquia, padre Bento foi
convidado para um almoço, num dia de domingo, na casa do prefeito. Estavam
presentes algumas autoridades da cidade, como o juiz, o promotor, o médico da
saúde pública e o comandante da polícia militar.
Violante Pimentel é procuradora
aposentada do Rio Grande do Norte
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O novo vigário demonstrou muita satisfação em relação à paróquia que
viera dirigir. Elogiou muito o povo da cidade, que, além do dízimo, mensalmente
dava uma boa colaboração à Igreja. Elogiou, também, o gosto musical das
mulheres da cidade, e não entendia porque elas, quando se confessavam, diziam sempre
que tocavam ou tinham voltado a tocar sanfona, como se tocar sanfona fosse
pecado. Falou que estava cansado de dizer, àquelas mulheres, que a música é um
dom divino e que elas podiam tocar sanfona à vontade, como também qualquer
outro instrumento musical.
A gargalhada ecoou no terraço da casa do prefeito, como se alguém
tivesse contado uma piada. Padre Bento quis saber por que os homens estavam
rindo tanto. O prefeito, então, contou ao vigário que o falecido padre Amaro
tinha substituído o pecado do adultério ou traição, pelas frases “toquei
sanfona", ou "voltei a tocar sanfona”. Padre Bento ficou encabulado
e, ao mesmo tempo, preocupado por ter permitido, inocentemente, que aquelas
mulheres adúlteras comungassem todos os dias. Muito sério, logo após o almoço o
vigário se despediu e voltou à casa paroquial, para descansar. À noite, ao
chegar à igreja, lotada, para celebrar a missa das 18.30, sua primeira
preocupação foi dar o seguinte aviso:
-- ATENÇÃO!!! QUERO AVISAR ÀS SENHORAS SANFONEIRAS, QUE HOJE ELAS
NÃO PODERÃO COMUNGAR!
Houve um sussurro dentro da igreja, pois a maioria dos fieis não
entendeu nada...Somente as próprias adúlteras "sanfoneiras"
entenderam o aviso.
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