DILMA RECORRE A LULA
PARA “ESFRIAR” IMPEACHMENT
SPONHOLZ |
(Por Josias de Souza, em
09/03/2016) Levados no embrulho da crise, a pior que um
governo do PT já enfrentou em quase 13 anos de poder, Dilma e Lula jantaram
juntos no Alvorada na noite desta terça-feira. Além da refeição, compartilharam
a avaliação segundo a qual os desdobramentos da Lava Jato e a estagnação
econômica retiraram o impeachment do freezer. A presidente recorreu ao seu
mentor para tentar, na definição de um auxiliar, “esfriar” a conjuntura que põe
em risco a continuidade do seu mandato.
Além
de Dilma e Lula, participaram do repasto no Alvorada outros três caciques do
PT: o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, e os ministros palacianos
Jaques Wagner (Casa Civil) e Ricardo Berzoini (Coordenação Política). Lula
programou-se para permanecer em Brasília nesta quarta-feira. Sua prioridade é
“segurar” o PMDB no governo, fazendo o que for necessário para evitar que o
pedaço anti-Dilma da legenda se torne majoritário.
O
partido do vice-presidente Michel Temer, substituto constitucional de Dilma,
realiza no sábado sua convenção nacional. Será compelido a discutir um tema que
se tornou incontornável: a proposta de rompimento com o governo. Pelo menos dez
diretórios estaduais defendem o desembarque: RS, SC, PR, ES, PE, MS, BA, AC, RR
e RO. Negocia-se uma saída intermediária: a legenda migraria para uma posição
de “independência”.
Na
manhã desta quarta, Lula deve tomar café com a caciquia do PMDB do Senado, à
frente o presidente da Casa, Renan Calheiros. Investigado em seis inquéritos da
Lava Jato, Renan vem sendo tratado por Dilma como uma espécie de herói da
resistência. Nas últimas semanas, reaproximou-se de Michel Temer, algo que
inquietou os operadores políticos de Dilma. Daí a decisão de Lula de sentir-lhe
o pulso.
"O alegado talento gerencial de Dilma
decresce na proporção direta do crescimento dos desafios.
Em privado, Lula não economiza críticas à sua criatura.
Disseminou-se entre os aliados do governo
a impressão de que a presidente reúne três debilidades:
é fraca, indecisa e inepta"
Pragmático
a mais não poder, Renan tenta farejar a direção dos ventos. Depois de iniciar o
dia tomando café com Lula, o senador fechará a noite desta quarta num jantar na
casa do senador tucano Tasso Jereissati (CE). A exemplo de Lula, o tucanato
também deseja saber que armas o PMDB pretende empunhar na batalha do
impeachment. Afora o anfitrião Tasso e os convidados peemedebistas, devem
participar do jantar pelo lado dos tucanos: Aécio Neves, José Serra, Cássio
Cunha Lima e Aloysio Nunes.
A
movimentação em torno do impeachment contrasta com a letargia do governo. Nesta
terça-feira, após participar de reunião com o ministro Berzoini, um líder de
partido governista comparou o governo a uma pessoa que sofre de “sonambulismo”
—caminha durante o sono, repetindo movimentos adquiridos pelo hábito. O próprio
pedido de socorro a Lula decorre desse hábito do governo de reagir às crises de
maneira automática e convencional.
O
problema é que aquele Lula mitológico que elegeu Dilma e ajudou na reeleição é
uma construção política do passado. O Lula atual, de carne e osso, é um
político tradicional, suspeito de tudo o que se costuma suspeitar nos
personagens dessa fauna. Hierarca da degeneração moral do petismo, Lula já não
enxerga em Dilma sua única prioridade. A Jararaca agora precisa administrar sua
morofobia.
Há
mais: Lula, Dilma e os operadores petistas lidam com um fenômeno que foge ao
controle do governo e da superestrutura partidária. A Lava Jato tornou-se uma
usina de surpresas tóxicas. Em poucos dias, prendeu João Santana, marqueteiro
das campanhas petistas; cavou a delação em que o ex-líder do governo Delcídio
Amaral atira em Lula e Dilma; arrancou um depoimento de Lula sob coerção e
condenou Marcelo Odebrecht a 19 anos e 4 meses de cadeia, mostrando-lhe as
vantagens da delação premiada.
Há
pior: o alegado talento gerencial de Dilma decresce na proporção direta do
crescimento dos desafios. Em privado, Lula não economiza críticas à sua
criatura. Disseminou-se entre os aliados do governo a impressão de que a
presidente reúne três debilidades: é fraca, indecisa e inepta. Juntas, suas
fragilidades a tornam menor do que a crise que ela ajudou a criar. É tão
diminuto o talento de Dilma que muitos enxergam nela a própria crise.
http://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na “Folha de S. Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro “A História Real” (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de “Os Papéis Secretos do Exército''.
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