15.03.2016
EM DESESPERO, DILMA TENTA
AUTOGOLPE COM LULA
DIVULGAÇÃO |
(Por Josias de Souza) O
brasileiro já ouviu muitas histórias de gente tirando gênio de garrafas. Mas
nunca antes na história desse país se ouvira falar de alguém obrigando o gênio
a retornar à garrafa. Na versão de um ministro petista é o que Lula está
fazendo com Dilma. Vendida em 2010 como gestora genial, ela foi convencida a
entregar ao antecessor o futuro dos escombros que restaram do seu governo.
Numa
tentativa desesperada de se livrar do impeachment, Dilma fará de Lula um
superministro, com sala no Planalto. Ele chefiará a articulação política do
governo e projetará sua sombra sobre toda a Esplanada, especialmente sobre a
pasta da Fazenda. Depois de acusar os rivais de tramar um golpe, Dilma recorre
a um autogolpe. Lula entrará pela porta dos fundos numa espécie de terceiro
mandato.
A
manobra envolve alto risco. Ao patrociná-la, Dilma como que exerce um dos
poucos privilégios que ainda lhe restam — o privilégio de escolher seu próprio
caminho para o inferno. Com o governo esfarelando-se, madame atrelou seu
destino ao de Lula, divorciando-se definitivamente das ruas.
No
último domingo, o asfalto roncara sobretudo para exigir o impeachment de Dilma
e prestigiar Sérgio Moro, cacifando-o para punir inclusive Lula ‘Jararaca’ da
Silva. Em resposta a essas demandas, Dilma resolveu unir o inútil ao
desagradável: para se manter no cargo, concede à serpente o foro privilegiado
dos ministros, livrando a cobra criada do PT dos rigores do juiz da Lava Jato.
“Quando
ainda era um presidente popular,
Lula
só conseguiu apoio no Congresso
comprando
aliados com o dinheiro sujo.
Os
parlamentares governistas continuam
com
o mesmo código de barras na testa”
O
movimento é inútil porque, ainda que consiga deter o impeachment, o máximo que
Lula fará por Dilma é acomodá-la no verbete da enciclopédia como a primeira
pessoa na história a se tornar ex-presidente ainda no exercício da Presidência.
É desagradável porque a presença de Lula na Esplanada, além de não ser um bom
exemplo, é um péssimo aviso: o governo entrou na fase do vale-tudo.
Tomado
pelo que se diz dele no Planalto, Lula retornará a Brasília para operar
milagres. Na política, promete reagrupar o bloco partidário que dava suporte
aos governos petistas no Congresso. Na economia, acena com uma reviravolta
capaz de abreviar a retomada do crescimento. Falta combinar com a lógica.
Quando
ainda era um presidente da República popular, Lula só conseguiu apoio no
Congresso comprando aliados com o dinheiro sujo do mensalão e do petrolão. Os
parlamentares governistas continuam com o mesmo código de barras na testa. Mas
o governo, com a força-tarefa da Lava Jato no seu encalço, já não pode
remunerá-los como antes. O novo superministro manuseará um orçamento em ruínas.
CAPA DE 07.10.2015 |
Não
é só: retratado nas ruas como um boneco-presidiário batizado de Pixuleco,
investigado por corrupção, tráfico de influência, lavagem de dinheiro e
falsidade ideológica, Luís Inácio já não é o mesmo Lula da Silva. É nessa
condição de ex-Lula que terá de convencer o PMDB, por exemplo, de que é mais
negócio permanecer com Dilma do que colocar na cadeira dela o correligionário
Michel Temer, seu substituto constitucional.
A
contabilidade do impeachment favorece Dilma. Para aprovar o pedido na Câmara,
os antagonistas do governo precisam reunir 342 votos. Para barrar o
impedimento, o Planalto tem de juntar apenas 171 votos. Líder do governo na
Câmara, o deputado José Guimarães (PT-CE) afirma que, se o governo não tiver
algo como duzentos votos no plenário, é porque a propalada governabilidade já
foi para o beleléu.
Na
economia, a guinada defendida por Lula e seus devotos no PT passa pelo abandono
de projetos como a reforma da Previdência e de estratégias como o rigor fiscal.
Tudo em nome de uma hipotética retomada do crescimento ainda em 2016. Como se
fosse possível colher bons indicadores sem plantá-los.
“Fica-se
com a impressão de que Dilma
passará
a dispor não de um ministro providencial,
mas
de um cúmplice full time.
E
dignidade é como virgindade.
Perdeu,
está perdida. Não dá segunda safra”
De
resto, a aposta do Planalto na capacidade de Lula de fazer e acontecer
desconsidera o fato de que a Lava Jato introduz na conjuntura muitas surpresas,
espantos, choques, assombrações e uma certa dose de ‘sim senhor, quem
diria?!?’.
Nesta
segunda-feira, por exemplo, enquanto o morubixaba do PT se equipava para os
novos desafios, veio à luz a notícia de que o ex-deputado federal Pedro Corrêa,
cacique da tribo do PP, preso em Curitiba, fechou um acordo de delação premiada
com a força-tarefa da Lava Jato.
Corrêa
contou aos investigadores, entre outras coisas, que Lula tinha plena ciência
das propinas que o PP beliscava na Petrobras. Aos pouquinhos, a turma de
Curitiba vai fechando o cerco ao redor de Lula. Ainda que fuja de Sérgio Moro,
presidente informal da República terá de se entender com o STF. E já estão no
forno novas delações.
Fica-se
com a impressão de que Dilma passará a dispor não de um ministro providencial,
mas de um cúmplice full time. De certo mesmo, o autogolpe propiciará, por
enquanto, uma perda da dignidade funcional de uma presidente em apuros. E
dignidade é como virgindade. Perdeu, está perdida. Não dá segunda safra. (Fonte: UOL)
http://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/
Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na “Folha de S. Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro “A História Real” (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de “Os Papéis Secretos do Exército''.
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