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RETRATO DO ARTISTA
QUANDO COISA
QUANDO COISA
A maior
riqueza
do homem
é sua
incompletude.
Nesse ponto
sou abastado.
Palavras que
me aceitam
como sou
— eu não
aceito.
Não aguento
ser apenas
um sujeito
que abre
portas, que
puxa
válvulas, que
olha o
relógio, que
compra pão
às 6 da
tarde, que vai
lá fora, que
aponta lápis,
que vê a uva
etc. etc.
Perdoai. Mas
eu
preciso ser Outros.
Eu penso
renovar o
homem
usando
borboletas.
O MENINO QUE
CARREGAVA
ÁGUA NA PENEIRA
ÁGUA NA PENEIRA
Tenho um
livro sobre águas e meninos.
Gostei mais
de um menino
que carregava
água na peneira.
A mãe disse
que carregar água na peneira
era o mesmo
que roubar um vento e
sair correndo
com ele para mostrar aos irmãos.
A mãe disse
que era o mesmo
que catar espinhos
na água.
O mesmo que
criar peixes no bolso.
O menino era
ligado em despropósitos.
Quis montar
os alicerces
de uma casa
sobre orvalhos.
A mãe reparou
que o menino
gostava mais
do vazio, do que do cheio.
Falava que
vazios são maiores e até infinitos.
Com o tempo
aquele menino
que era
cismado e esquisito,
porque
gostava de carregar água na peneira.
Com o tempo
descobriu que
escrever
seria o mesmo
que carregar
água na peneira.
No escrever o
menino viu
que era capaz
de ser noviça,
monge ou
mendigo ao mesmo tempo.
O menino
aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia
fazer peraltagens com as palavras.
E começou a
fazer peraltagens.
Foi capaz de
modificar a tarde botando uma chuva nela.
O menino
fazia prodígios.
Até fez uma
pedra dar flor.
A mãe
reparava o menino com ternura.
A mãe falou:
Meu filho você vai ser poeta!
Você vai
carregar água na peneira a vida toda.
Você vai
encher os vazios
com as suas
peraltagens,
e algumas
pessoas vão te amar por seus despropósitos!
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