ILUSTRAÇÃO: SPONHOLZ |
O
INVERNO DO PATRIARCA
O
roteiro de um filme sobre a história real de Lula seria recusado
por
qualquer produtora, por fantasioso e inverossímil
Por Nelson
Motta
O
Globo – 15/09/2017
Lula
diz que prefere a morte a entrar para a história como um mentiroso. Mas essa é
uma de suas maiores mentiras.
Ele
ama o poder, a glória e a boa vida e nunca teve vocação para mártir, embora na
astrologia seja do signo do escorpião, que, cercado pelo fogo, prefere ferroar
a si mesmo a se entregar.
Ainda
há uma questão semântica: as bravatas, em que ele é mestre, tecnicamente, são
consideradas mentiras ou exageros? Há controvérsias.
Lula
aprendeu com Dilma, ou ela com ele, a chamar de “querida” (com aspas) quem lhe
faz perguntas incômodas. Em Curitiba, ele foi advertido porque insistia em
chamar de “querida” a procuradora que o interrogava, mas não chamava de
“querido” os procuradores machos. E sempre se referia a sua mulher, sua
verdadeira querida, como “Dona” Marisa, a responsável pela administração da
família.
Em
2009, Ali Kamel publicou o “Dicionário
Lula — um presidente exposto por suas próprias palavras”, uma compilação de
672 páginas com o que Lula disse sobre os mais diversos temas, sem correções,
direto da fonte.
O
verbete “Discurso” tem muitas citações, algumas premonitórias: “Um dia vão
ganhar dinheiro pela quantidade de discursos que eu faço todos os dias. Eu
ficaria milionário”.
No
dicionário, ele se revela um personagem riquíssimo e contraditório, ou como ele
mesmo reconhece, uma metamorfose ambulante. Imaginem de lá para cá! Esperamos
um volume 2.
Um
de seus clássicos é dizer que aprendeu com sua mãe a não abaixar a cabeça para
ninguém. Mesmo quando está errado, não reconhece seus erros e nem se
responsabiliza por eles. Pedir desculpas, nem pensar. Mas ele vive dizendo a
juízes, delegados e procuradores que espera que eles lhe peçam desculpas um
dia.
Ao
contrário do sucesso do filme da Lava-Jato, “Lula, o filho do Brasil” foi um
fracasso retumbante nos cinemas, contando a sua infância e juventude. Mas um
filme com o resto da sua história até hoje certamente seria um sucesso. O
problema é que um roteiro factual, documental, contando fielmente a sua
história, seria recusado por qualquer produtora do mundo, por fantasioso e
inverossímil.
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