CHARGE: AMARILDO |
“NÓIS
NÃO VAI SER PRESO”
Muita
arrogância, muita soberba. Voou alto demais e se danou.
O
rei da carne está virando picadinho
Por
Luiz Flávio Gomes
Blog
do autor
11/09/2017
Joesley assassinou a língua
portuguesa (“nós não vai”) e se mostrou ruim em previsões. Já está na cadeia
(em prisão temporária, de cinco dias, por ora). Ele e o executivo Saud. Por
enquanto não há prisão contra o ex-procurador da República Marcello Miller.
A controvertida delação de Joesley
deixou de ser um enigmático jogo de xadrez. Na verdade, é o xadrez que entrou
no jogo, testemunhando o choro de Joesley.
Nas cleptocracias parasitárias as
elites dirigentes que governam a nação (empresariais, financeiras e políticas)
praticam o abominável capitalismo bandido (de compadres, de laços, de amigos).
Nesse tipo de capitalismo, o deplorável poder do dinheiro (frequentemente)
corrompe o humano. A corrupção, em seguida, corrompe seu cérebro (aniquilando
as antenas éticas das amigdalas cerebrais).
Joesley voou muito alto. Esqueceu-se
da advertência de Dédalo, pai de Ícaro. Se sentiu o dono absoluto da
cleptocracia brasileira. Achou que nunca seria preso. Comprou o Executivo e o
Legislativo (deu propinas para mais de 1800 políticos eleitos).
Grampeou Temer e Aécio Neves,
colocando em cena safadagens e delitos que normalmente ficariam “ob scenum”
(fora de cena).
Conseguiu de Janot sua imunidade
penal, zarpou para Nova York como vencedor e achou que um dia poderia
chantagear inclusive os ministros do STF (via ex-ministro da Justiça). Muita
arrogância, muita soberba. Voou alto demais e se danou. O rei da carne está virando
picadinho.
Sua delação será profundamente
revisada. É provável (e desejável) que passe um bom tempo na cadeia
(espera-se). Mas as provas validamente colhidas serão aproveitadas, incluindo
os áudios escabrosos de Temer e Aécio (que estão dentro da jurisprudência do
STF).
Ícaro e seu pai Dédalo (que era
arquiteto) estavam refugiados em Creta, junto ao rei Minos. Depois do
nascimento do seu filho Minotauro (corpo de homem e cabeça de touro), foi
construído um labirinto para aprisioná-lo. Ele acabou sendo morto por Teseu
(veja Wikipedia); Ícaro e Dédalo ficaram presos no labirinto. Este, para
reconquistar a liberdade, construiu asas artificiais, usando cera do mel de
abelhas e penas de gaivotas. Antes da fuga, o pai alertou o filho de que não
podia voar perto do Sol, porque ele derreteria a cera das asas coladas ao seu
corpo; nem muito perto do mar porque, se tocasse suas águas, suas asas ficariam
muito pesadas. Ícaro não ouviu os conselhos do pai e, tomado pelo desejo de
voar próximo ao Sol; o calor fez com que perdesse as asas e despencasse no mar
Egeu, enquanto seu pai, aos prantos, voava para a costa. Moral da história
mitológica: Ícaro pode voar alto, talvez até consiga atingir alturas
impensáveis, mas não pode atingir o cume, o topo, ou seja, o Sol.
Joesley atingiu o Sol chamado STF,
que em matéria de corrupção lenientemente mais atende os interesses das
oligarquias dominantes que os da cidadania. O retorno de Aécio ao Senado foi
uma vergonha absurda. A manutenção de Renan Calheiros na presidência do Senado
(7/12/16) não deixou nada a dever.
Mas desde a prisão de Delcídio foi
criado o precedente: o risco é muito grande quando a bandidagem faz bravatas ou
insinuações com os ministros do STF.
Fachim foi pressionado por alguns
colegas. Fux chegou a falar em “exílio na Papuda”. Abominável antecipação de
voto, conforme a escolinha do Gilmar. Cármen Lúcia reprovou a tentativa de
chantagem da Corte. O STF é um tribunal reativo. Quando alguém mexe com seus
brios, lá vem prisão. Fora disso, o gigante dorme em berço esplêndido. Desde
1/8/17 o pedido de prisão de Aécio Neves está parado. E o homem diz que vai se
candidatar para o Senado, novamente. Só numa cleptocracia degenerada isso
acontece.
“O mundo é um lugar perigoso para se
viver, não [só] por causa daqueles que fazem o mal, mas por causa daqueles que
observam e deixam o mal acontecer” (Albert Einstein).
Joesley foi encarcerado. Preponderou
o império da lei. Isso, num país de costumes frouxos, é ponto fora da curva.
Resta ainda recuperar o dinheiro roubado da população.
(*) Luiz Flávio Gomes é Doutor em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade Complutense de Madri (2001) e Mestre em Direito Penal pela Faculdade de Direito da USP (1989). Criador do movimento “Quero um Brasil Ético”. Jurista e professor em vários cursos de pós-graduação nacionais e internacionais, entre eles a Facultad de Derecho de la Universidad Austral, Buenos Aires (Argentina), já tendo publicado mais de 57 livros na área jurídica. É também membro da Comissão de Reforma do CP e Professor Honorário da Faculdade de Direito da Universidad Católica de Santa María (Arequipa/Peru). Atuou como Promotor de Justiça em São Paulo, de 1980 a 1983; Juiz de Direito, de 1983 a 1998; e Advogado, de 1999 a 2001. (
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