PREFERÊNCIA NACIONAL
(Por Clóvis
Campêlo) Segundo
Renato Boca-de-Caçapa, o filósofo do lumpen-proletariado, se existem duas
coisas que mexem com o imaginário do brasileiro são a bunda e o futebol.
Diferentemente
dos americanos, que preferem um peito suculento e exagerado, a bunda é tão
querida por nós que até o circunspecto poeta Carlos Drumond de Andrade
dedicou-lhe um poema rotundo. Na Bahia, o filósofo e escritor Antônio Risério
dedicou-lhe uma monografia repleta de citações científicas e levando em conta
todas as regras da ABNT. Ou seja, coisa séria! E não poderia ser diferente,
diante dessa magnífica região corpórea onde a nossa imaginação pagã vagueia sem
lenço e sem documento. A bunda hiponotiza o brasileiro.
Quanto
ao futebol, ele representou o início da nossa redenção, enquanto povo moreno e
terceiromundista. Segundo o escritor Nélson Rodrigues, foi o futebol que, nos
distantes anos 50 e 60 do século passado, nas conquistas do bicampeonato
mundial, na Suécia e no Chile, nos livrou da pecha de vira-latas.
O
futebol, também, em que pese toda a conotação de mercadoria valiosa por ele
adquirida hoje em dia, devolve-nos o sentimento de coletividade que, de certo
modo, perdemos diante do individualismo desenfreado da vida moderna. Coisa boa
é irmos aos estádios e nos identificarmos com a torcida do nosso time querido,
abraçar quem nunca vimos, gritarmos gritos de guerra e cantarmos em uníssono os
nossos hinos. Para mim, o futebol é a demonstração viva de que o homem é um ser
coletivo, de que a individualidade é uma coisa forjada em nós pelo sistema. Bom
é estar ali, no meio do povo, a cantar, a dançar, a sorrir, a vibrar,
independentemente de tudo. Bom, naquele momento, é sermos aquela família.
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Mas,
chega de pronomes demonstrativos e de digressões. É hora de cairmos na real e
comentarmos sobre essa guerra de bichos em que se transformou o campeonato
pernambucano. É jumento, calango, periquito, patativa, leão, timbu, gavião e
cobra coral. Uma verdadeira arca de Noé. Em se tratando de mascotes diferentes,
só temos a máquina de costura e o cangaceiro. E é justamente esse último que
vem predominando e surpreendendo nessa duas rodadas iniciais do estadual. Com
duas sonoras goledas, o time do Serra Talhada lidera o torneio e terá sua prova
de fogo no próximo domingo, em casa, contra o Santa Cruz, que repetiu a
mediocridade do primeiro jogo e levou uma porrada do Salgueiro. Segundo a
crônica especializada, o placar de 2x0 foi até injusto para o time do sertão.
Penso
que é hora do Santinha acordar, deixar de lado o discurso idiota de que o que
nos interessa de fato é a ascensão à Série B do Campeonato Brasileiro e honrar
o título de campeão pernambucano de futebol que hora defende.
Recife,
2012
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