VISAGEM
(Por Clóvis Campêlo) Não
sabia se fora um sonho ou uma alucinação.
São
Jorge vinha na frente, montado em seu cavalo branco. A luz do sol refletia na
sua viseira prateada e projetava no chão uma imagem imponente.
Logo
atrás, vinham Dom Sebastião, Zumbi dos Palmares e Antônio Conselheiro,
ressuscitados, em estranhas carruagens de fogo.Em seguida, vinha um exército de
caboclos de lança, com suas roupas coloridas e chocalhos estridentes. E eram
tantos que nem todos os mouros de Alcácer-Quibir dariam conta.
Findando
o cortejo, vinham os batuqueiros dos maracatus africanos, detonando os seus
tambores. E a nuvem de poeira que levantavam era tão imensa que poderia ser
vista a quilômetros de distância. E o som de trovão que emitiam era tão intenso
que o céu se partia ao meio, no meio da tarde.
Por
sobre o fabuloso exército, anjos vestidos de branco tocavam trombetas douradas,
anunciando uma nova ordem.
O
poderoso exército avançava e por onde passava era seguido por uma multidão de
doentes e famintos. E todos se sentiam fortes e revigorados como se um milagre
estivesse acontecendo. E todos sabiam que eram partes integrantes de uma
gigantesca e profunda mudança prestes a acontecer.
A
força da fé que animava a multidão era tão grande que rios poluídos se
transformavam em leitos de águas cristalinas, repletas de peixes.
A
aproximação da turba revolucionária fazia brotar espontaneamente dos campos a
colheita semeada e tudo era irmamente dividido.
Não
sabia se fora um sonho ou uma alucinação.
Recife,
2002
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