Estava tudo acertado, combinadinho da silva. Mas gorou.
A família não entendia por que aquela rede de tevê
queria entrevistá-lo, menos ainda por que queria saber sua opinião sobre
assuntos tão diversos – da passeata gay à festa de Iemanjá, sem descuidar do
aumento da passagem dos transportes coletivos. Não era ZIca. Nem Canô.
-- Diga à tevê que eu topo. Falo sobre tudo. Pra
mim, não há, nunca houve, assunto tabu. Até que enfim, alguém resolveu dar
valor à experiência, a forma mais sólida de sabedoria. Que venha a tevê. Vou me
banhar, fazer a barba, coçar o pé, botar o pijama novo.
A equipe chegou. A repórter foi logo passando ao Velho
Marinheiro as instruções:
-- Vou lhe perguntar isso. Depois, aquilo. Seja
breve. O tempo de tevê é curto...
-- Princesa, não se preocupe: sou de pouco falar.
Eis que entra em cena o maquiador. Precisava passar um pó no rosto do lobo do mar, para retirar o excesso de
brilho.
-- É de praxe, vovô.
-- Vovô, o cacete. Nunca tive neto veado. Que eu
saiba!
Conversa daqui, conversa de lá, o Velho Marinheiro
aquiesceu:
-- Mas não pinte minhas bochechas de vermelho. Quem
gostava de ruge era sua avó, que conheci bem. Não ouse sapecar pontinhos
pretos. Homem como a senhora não merece confiança, ainda mais
numa época como essa: de festejos juninos.
A coisa desandou de vez, quando o maquiador
ponderou:
-- Sem um batom neutro nos lábios...
A correria foi grande; o vexame, imenso. A equipe se mandou sem cumprir a pauta, em solidariedade ao maquiador.
O Velho Marinheiro, nosso Lobo do Mar, resolveu que entrevistas, dali pra frente, só pra jornal ou rádio. Ou por escrito.
O Velho Marinheiro, nosso Lobo do Mar, resolveu que entrevistas, dali pra frente, só pra jornal ou rádio. Ou por escrito.
(ORLANDO SILVEIRA - 2013)
Nenhum comentário:
Postar um comentário