INTERNETSÓ OS VALENTES SE CASAM |
Naquele tempo era um porre de bebida ordinária, hoje não sei como é. Ninguém se casava na Igreja Católica sem ter feito um cursinho preparatório. Estou convencido de que o dito cujo não preparava ninguém para nada, muito menos para uma vida a dois, como se dizia. Seu objetivo era medir a paciência dos nubentes. Se conseguissem concluí-lo, estavam prontos para tudo. Até para almoçar na casa da sogra todos os domingos.
A duração do curso
variava de igreja para igreja. Sabiá, mais por desligamento que por fé,
escolheu o mais longo. Foram quatro sábados consecutivos de tortura. Os temas
das palestras não me interessavam. Pelo visto não interessavam a quase ninguém.
A turma, uns vinte casais, bocejava sem parar depois dos primeiros dez minutos
de exposição. Os palestrantes eram de uma ruindade ímpar. Não diziam coisa com
coisa. E ainda pretendiam ser engraçados. O que é sempre uma lástima. E eu com
a garganta seca, porque ninguém vai a um lugar desses tocado.
Alimentei alguma
fantasia em relação à última palestra. De todas, era a que abordava assunto
mais palatável: economia doméstica. Não foram necessários mais que cinco
minutos para que as ilusões virassem pó. O ilustre palestrante valeu-se de
recursos tecnológicos para cativar a plateia: lousa, giz e apagador. O homem só
trabalhava com percentuais. Pouco importava se um ganhava R$ 2 mil e o outro R$
20 mil. Ali, éramos iguais na alegria e na tristeza: recebíamos 100%. Não sei
se era adepto do socialismo real. Não me parecia tolo a tal ponto.
O homem começou,
então, a enumerar as despesas e seus respectivos percentuais. Moradia: X%.
Alimentação: Y%. Vestuário: Z%. No papel, ou melhor, na lousa, parecia que
estávamos a caminho da felicidade absoluta. Sobravam até 10% ou 15% para a
poupança. Quer mais o quê, mano velho? É só dizer “sim” no altar e sair para o
abraço.
Mas não estava tudo
bem. Um gaiato percebeu que a soma das despesas dava 120%, sem levar em conta a
tão desejada poupança. Ou seja: em vez de superávit primário, tínhamos um
déficit grotesco. Avisado, o palestrante pegou o apagador e começou a fazer as
correções. “Agora, sim”, disse ele. O gaiato não se deu por vencido. Somou uma
vez, somou duas – e chegou à conclusão de que, apesar dos ajustes, a conta
continuava não fechando. Suando em bicas, o palestrante partiu para uma nova
rodada de acertos. Em vão. As despesas, agora, somavam 90% incluindo a
poupança.
Morto de sede, como
todos nós, e com medo de que os remendos continuariam até a manhã do domingo, o
rapaz disparou:
- Agora, sim, mestre,
está perfeito. Os 10% que faltam são para o dízimo, não são?
- Você é muito
inteligente, perspicaz – suspirou aliviado o palestrante. Abençoado. Nossos
trabalhos estão encerrados.
E fomos aos copos.
Certos de que não sobraria um tostão para a poupança. E para o dízimo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário