O PASSADO NÃO PASSA.
E O NOVO NÃO NASCE
A irresponsabilidade da elite política nesta grave crise
só não é maior do que a da elite empresarial, que se
acomoda a qualquer presidente
Por Marco Antonio Villa
Correio Braziliense
O Estado de Minas
14/02/2018
É inegável o cansaço com a
política. Ninguém aguenta mais. Pior ainda, a insatisfação não é só com a
política. Atinge todas as esferas do Estado brasileiro. Nem a Poliana mais
convicta encontra ambiente para elogiar o Brasil. Vivemos a crise mais longa e
profunda da nossa história. Longa porque teve início, de forma mais clara, no
início desta década. Profunda porque atinge o conjunto da estrutura estatal.
Nada indica que a solução para este
impasse seja resolvido nas próximas eleições. A crise é de tal magnitude que
nenhum processo eleitoral resolve. Muito menos o do próximo outubro que
reforçará o que há de mais arcaico na política brasileira. Isto porque com a
atual legislação eleitoral as possibilidades de mudança deste terrível quadro
são quase nulas – mesmo com diversos esforços de entidades que tentam oxigenar
o universo político.
A sucessão de eleições a cada dois
anos deu a falsa sensação de que a democracia estava consolidada. Confundiu-se
o processo eleitoral com a democracia propriamente dita. Se não há democracia
sem voto direto, é inegável que isto só não basta. Evidentemente que em um país
que lutou tantos anos para eleger diretamente o presidente da República, o ato
de poder escolher livremente um candidato é considerado o supra sumo da cidadania.
Contudo, o que está sendo questionado não é o ato de votar, mas o processo que
conduz até à eleição. Enquanto não for profundamente alterado, o sistema
continuará em crise. Mais ainda, cada crise será mais grave que a anterior,
paralisando a administração do presente e impedindo a construção de um outro
futuro.
“O terreno está aberto aos aventureiros.
É o máximo de mudança permitido pelo sistema.
O aventureiro dá a entender que terá um poder muito
superior ao que de fato terá”
O atual processo eleitoral para a
Presidência da República é uma demonstração cabal desta tensão. Todos falam da
necessidade do novo. Mas como, se a estrutura é arcaica e imune à mudança? Onde
está o novo? O novo não surge do nada, mas é produto de um processo
histórico-político. Manifesta-se de diversas formas em meio a uma sociedade
participante, ativa e que produz diversos projetos para o país. É evidente que
este não é o nosso caso, até porque participação de fato é algo que não existe
nesta república marcada pelo privilégio e compadrio, em que a política
continua, em pleno século XXI, sendo dominada por interesses familiares em boa
parte das unidades da federação.
Desta forma, o terreno fica aberto aos
aventureiros. É o máximo de mudança permitido pelo sistema – e que não resolve
a crise, muito pelo contrário. O aventureiro se destaca dos políticos
tradicionais buscando incorporar um discurso novo em meio a uma estrutura
velha. Imputa a si o papel da mudança. Dá a entender que terá um poder muito
superior ao que de fato terá. Ilude o eleitorado. Mais ainda, infantiliza o
debate político. Apresenta respostas simples aos problemas mais complexos do
país. Tudo se resume a ter vontade e agir em nome do povo. Não quer cidadãos,
quer seguidores. E será ele que dirá o que e como fazer.
Marco Antonio Villa é historiador |
É o cenário ideal para proliferar
extremismos. Ainda mais em um país que não tem uma tradição democrática
consolidada. O eleitor perdeu a paciência. Descrê no sistema e não consegue
vislumbrar como mudá-lo. O extremista apresenta uma solução – por mais enganosa
que seja. Insiste no uso da força, na retórica e na ação. O discurso é
reducionista. No lugar do debate e da pluralidade, o extremista impõe a sua voz
– só a sua. E como não encontra na arena política ninguém que o enfrente, vai
conquistando posições que o transforma em alternativa ao apodrecimento do
sistema. A suprema ironia é que o extremista foi gestado no interior da
política tradicional, a mesma que diz combater.
A irresponsabilidade da elite
política nesta grave crise só não é maior do que a da elite empresarial. Esta
se acomoda a qualquer presidente, basta recordar como agiu durante os 13 anos
de petismo no poder. Em momento algum, mesmo durante o processo de impeachment
de Dilma Rousseff, se manifestou em defesa do respeito à coisa pública. Já a
elite política se movimenta como se nada tivesse acontecido, como se a
população tivesse, com ela, um verdadeiro caso de amor cívico. O mais trágico é
que o país não consegue sair do labirinto da crise e não há, à disposição,
nenhum Teseu que possa liderá-lo.
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