Alckmin vive assombrado com os "amigos" Foto: arquivo Google |
ALÉM DA SOMBRA DE HUCK,
ALCKMIN ENFRENTA DORIA
O tucanato se esforça para confirmar a fama que fez do PSDB
um partido de amigos feito integralmente de inimigos
Por Josias de Souza
UOL – 09/02/2018
As coisas poderiam caminhar bem para o tucano Geraldo Alckmin, pois
seu processo na Lava Jato estacionou no STJ, Lula tornou-se inelegível, Jair
Bolsonaro parou de subir no Datafolha e abriu-se na sucessão de 2018 uma
avenida para a passagem de uma candidatura presidencial de centro. Mas o PSDB
parece ter mergulhado num processo de autodestruição. Além do fantasma da
candidatura de Luciano Huck, ressuscitado por Fernando Henrique Cardoso,
Alckmin toureia nos porões do partido as ambições políticas do seu próprio
pupilo, João Doria.
Quanto a FHC, não há muito o que Alckmin possa fazer. Impossível
controlar um ex-presidente da República cultuado como presidente de honra do
ninho. Resta ao candidato digerir as juras de fidelidade do correligionário.
Juras que foram renovadas por FHC num telefonema que disparou para o Palácio
dos Bandeirantes nesta quinta-feira, pouco antes do horário em que receberia
Huck para o jantar. A disposição é outra em relação a Doria. Operadores de
Alckmin aconselham-no a desligar o prefeito de São Paulo da tomada.
Há dois dias, Doria irritou Alckmin ao tentar uma manobra na reunião
da Executiva Nacional do PSDB, em Brasília. Discutia-se a regulamentação das
prévias presidenciais do partido, nas quais Alckmin medirá forças com o prefeito
de Manaus, Arthur Virgílio. Agendou-se a eleição interna para a escolha do
presidenciável da legenda para 4 de março (a data já passou para o dia 11 e
ainda pode ser empurrada para 18 de março). Doria queria estender o calendário
federal à prévia estadual, que definirá o nome do candidato do PSDB ao governo
de São Paulo. Alckmin e sua infantaria levaram os pés à porta.
Josias de Souza/ YouTube |
Deve-se o interesse de Doria a uma necessidade funcional. Para
disputar um novo cargo público, ele terá de deixar a prefeitura paulistana até
o dia 7 de abril. E seria mais confortável se pudesse renunciar ao cargo de
prefeito depois de ter obtido a vaga de candidato do PSDB ao governo estadual.
O problema é que Alckmin flerta com a ideia de uma candidatura única do seu
grupo político em São Paulo. Nessa hipótese, a chapa seria encabeçada pelo
vice-governador Márcio França, do PSB. O PSDB indicaria o vice e um candidato
ao Senado.
França assumirá o governo paulista em abril. E costura sua própria
candidatura à reeleição. Um eventual acerto com o PSDB em São Paulo ofereceria
a França matéria prima para tentar convencer o seu PSB a apoiar o projeto
federal de Alckmin, cedendo-lhe o tempo de propaganda eleitoral no rádio e na
TV. Escorando-se numa banda do tucanato que não abre mão de disputar o governo,
Doria rema em sentido contrário.
Vencido na Executiva Nacional, o prefeito corre contra o relógio
para marcar as prévias de São Paulo. A decisão seria tomada na próxima
terça-feira (13), numa reunião da Executiva estadual. Por conta do Carnaval, o
encontro foi adiado para 26 de fevereiro. Se depender de Alckmin, as prévias
serão marcadas para alguma data entre o final de abril e o início de maio.
Desse modo, se quisesse entrar no jogo, Doria teria de trocar o certo (o cargo
de prefeito) pelo duvidoso (a candidatura a governador).
Ironicamente, Doria deve justamente a Márcio França parte do seu
êxito na eleição em que conquistou a prefeitura da cidade mais rica do país.
Foi o vice de Alckmin quem capitaneou a costura da aliança partidária que forneceu
a Doria uma vitrine eletrônica ampla na disputa municipal de 2016. Comunicador
eficaz, Doria prevaleceu no primeiro turno da eleição. Agora, França move a
cintura política em benefício de sua própria candidatura, encurtando a margem
de manobra de Doria.
Nesta quinta-feira, Doria encontrou-se em São Paulo com Michel Temer
e o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, que cogita disputar o governo paulista
pelo PMDB. Realizada a portas fechadas, a reunião resultou em duas versões
antagônicas. Correligionários de Temer fizeram circular a informação de que o
presidente aconselhou Doria a permanecer na prefeitura, abstendo-se de disputar
a poltrona de governador.
O prefeito por sua vez, desperdiçou saliva difundindo a versão
segundo a qual a conversa abriu caminho para a negociação de uma coligação com
o PMDB no Estado e no país. Alckmin observa o vaivém de sua criatura com um pé
atrás. O governador já não confia integralmente no prefeito que apadrinhou. Em
privado, rumina o receio de que Doria volte a ser mordido pela mosca azul da
Presidência da República, convertendo-se numa espécie de Huck doméstico.
Como se vê, o tucanato se esforça como nunca para confirmar a fama
que fez do PSDB um partido de amigos feito integralmente de inimigos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário