Huck vem aí... Será? Foto: Divulgação |
LUCIANO HUCK, O ATOR E SUAS CIRCUNSTÂNCIAS
Não é possível afirmar, já, que Huck será candidato à presidência.
Todavia, pistas e ''mal-entendidos'' — como a aparição no Domingão
do Faustão, marcante demais para ser apenas acidente
— alimentam a lenda que pode tornar-se realidade
Por Carlos Melo
UOL – 06/02/2018
No final de novembro, Luciano Huck publicou na Folha de S. Paulo um artigo em que afirmava não pleitear
candidatura alguma à presidente da República, nesta eleição pelo menos.
Comparava-se a Ulisses, de ''A Odisseia'', dizendo amarrar-se aos mastros de
forma a não ceder aos cantos das sereias. Causou impacto porque, naquelas
semanas, os boatos e a expectativa de sua candidatura se expandiam
aceleradamente.
No mesmo dia, publiquei neste BLOG um artigo que procurava captar,
nas entrelinhas, o sentimento mais profundo do apresentador da TV Globo.
Afirmei que a impressão que sua ''negativa'' deixava era a de que ''as portas
de Huck para a política parecem mais abertas que fechadas''. Até porque,
afirmava, ''em política nada é definitivo''.
Com efeito, se as circunstâncias persistissem, seria muito provável
que o espaço para um outsider, ao
feitio de Luciano Huck, continuasse em aberto. E ''logo mais adiante'',
ponderava, ''novas turbulências podem produzir ondas de 'queremismo' por esse
tipo de ator. Um canto aí, sim, irresistível seja para Ulisses tanto quanto
para aqueles que o rodeiam''.
O problema do outsider é
que ele pode ser qualquer pessoa, mas jamais será qualquer um. Esse espaço,
quando aberto, espera ser ocupado por características específicas e bem
definidas. Alguém amplamente conhecido, sem qualquer problema de recall; alguém
com franca e direta comunicação com a massa de eleitores. Alguém que signifique
mais que uma promessa (e aposta) de elevação do que a certeza de mediocridade.
Carlos Melo, cientista político e professor do Insper
Foto: Fecomércio -SP
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Não há muitos assim. Joaquim Barbosa, por exemplo, parece mercurial
demais, personalista demais para um sistema político tão complicado e repleto
de armadilhas como o brasileiro. Ademais, não se saberia com que equipe poderia
contar, ao contrário de Huck cujos nomes de eventuais ministros já são desde
logo aventados, para reduzir a resistência a seu nome.
Na ocasião, não escrevi, mas tenho repetido que, como estratégia, o
artigo e a ação de Huck eram perfeitos: a porta aberta nas entrelinhas
permitiria um recuo do recuo. E afastamento evitava que se sujeitasse a todo
tipo de pancada a que estaria exposto. Por que antecipar constrangimentos
quando é possível protelar? Encurtar a exposição, reduzindo desgastes e
aumentando a intensidade do impacto de uma decisão.
Coisa fácil de entender: ao invés de submeter-se a pressões,
investigações, ilações e eventuais denúncias pelo prazo de um longo ano, seu
artigo tem lhe permitido reduzir esse processo a apenas seis meses — com uma
Copa do Mundo, naturalmente dispersiva de atenções, no meio do caminho.
Não é possível afirmar, já, que Huck será candidato à presidência.
Como tudo nessa conjuntura, qualquer cenário nasce, morre e ressuscita sem uma
lógica que se possa capturar. Todavia, pistas e ''mal-entendidos'' — como a
aparição no Domingão do Faustão,
marcante demais para ser apenas acidente — alimentam a lenda que pode tornar-se
realidade.
O fato é que o espaço para um outsider
com as suas características continua como uma ampla avenida aberta para as
urnas de outubro próximo. E, em dois meses, as circunstâncias só fazem reforçar
esse sentimento.
Desde a publicação de seu artigo, nenhuma candidatura do
autodenominado ''centro democrático'' se consolidou. Henrique Meirelles
permanece mais como candidato de sua vontade do que de forças políticas capazes
de alavancá-lo. A candidatura de Rodrigo Maia coloca-se como vagalume,
acendendo e apagando ao sabor da desgraça ou sorte de seus aliados/adversários
de base governista: Temer, Meirelles e Alckmin.
A candidatura de Michel Temer, embora plausível, seria apenas uma
cartada para negociação e não pode ser levada a sério, consideradas suas
chances de vitória.
“Na volatilidade que se vive, as circunstâncias pesam mais
que os atores, cujos desejos ou indisposição tornam-se detalhes,
variáveis de segunda ordem. Na verdade,
circunstâncias assim determinam a lógica dos atores, não o contrário.
Quem os navega é o mar”
Geraldo Alckmin, o candidato em melhores condições neste campo,
continua patinando nas sondagens de intenção de voto, com índices pouco
expressivos — entre 8% e 11%. O que, para um político que já concorreu à
presidência e cumpre o QUARTO mandato como governador do maior e mais visível
estado da federação é pouco, mesmo para esta fase do processo.
Além disso, a mais que provável ausência do ex-presidente Lula, nas
urnas, abre amplo espaço para um candidato popular, acostumado a se comunicar
com os setores mais pobres — e majoritários — do eleitorado como um braço
assistencialista e sem assustá-lo com radicalismos e promessas de uso
atabalhoado da força.
A propósito, a ausência do petista ocasiona a mesma fragmentação de
forças que se vê ao centro, agora, na esquerda sem um aglutinador natural. A
fragmentação somada às possibilidades de elevados índices de abstenção, brancos
e nulos desenha um cenário em que Jair Bolsonaro, à frente de fiéis setores
rediviva Linha Dura, começa a assustar.
Assim, entre os que rodeiam Luciano Huck, cresce a angústia e
ansiedade, e ondas de ''queremismo'' tornam-se inevitáveis. O nome do
apresentador volta à boca de políticos e analistas, consta das sondagens
eleitorais, num ciclo que enfraquece, ainda mais, Geraldo Alckmin, colocando
maior volume de água do moinho de Huck. O que faz com que se pressinta o risco
de ''cristianização'' de Alckmin.
Enfim, se será candidato ou não, é provável que nem mesmo Luciano
Huck consiga responder. E qualquer um que o faça neste momento arrisca-se a
escrever na água. Na volatilidade que se vive, as circunstâncias pesam mais que
os atores, cujos desejos ou indisposição tornam-se detalhes, variáveis de
segunda ordem. Na verdade,
circunstâncias assim determinam a lógica dos atores, não o contrário. Quem os
navega é o mar.
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