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BARBÁRIE
Poucas
coisas são mais importantes no Brasil hoje
do
que apurar o ocorrido na UFSC
Por
Paulo Nogueira Batista Jr.
O
Globo – 08/12/2017
O
estado de direito, as garantias individuais, o amplo direito à defesa, a
proteção contra o abuso de autoridade, a presunção de inocência — tudo isso é
como o ar que se respira, a água que se bebe. Só nos damos conta da sua
importância vital quando nos são retirados.
O
Brasil parece caminhar a passos largos para um estado de exceção, em que
prevalecerá o arbítrio, a truculência, o desrespeito aos direitos humanos. A
barbárie avança a olhos vistos. Nos últimos dias, tivemos um ataque à
Universidade Federal de Minas Gerais — episódio que parece fazer parte de uma
ofensiva contra as universidades públicas.
Mais
uma vez, assistimos ao abuso da prisão coercitiva do reitor e de professores da
universidade, uma humilhação desnecessária e ilegal. Mais uma vez, integrantes
do Poder Judiciário e da Polícia Federal se aliaram à mídia para fazer operação
espalhafatosa e arbitrária de combate à corrupção. Soldados armados até os
dentes, como se estivessem enfrentando perigosos inimigos, invadiram uma
universidade para expor professores à execração pública.
Ainda
pior foi o que aconteceu há pouco tempo em Florianópolis, na Universidade
Federal de Santa Catarina. Prenderam o reitor Luiz Carlos Cancellier, sob a
acusação de que ele estava obstruindo investigações. A mídia se encarregou de
jogar o seu nome na lama, como corrupto e responsável por desvio de imensas
somas. Na prisão, foi submetido a humilhações. Depois de solto, foi proibido de
entrar na universidade.
O
trabalho na universidade era sua vida. Poucos dias depois, o reitor Cancellier
atirou-se do alto de um shopping em Florianópolis. No bolso, trazia o bilhete:
“A minha morte foi decretada quando me baniram da Universidade!”. Poucas coisas
são mais importantes no Brasil hoje do que apurar o ocorrido na Federal de
Santa Catarina e punir os responsáveis pelo abuso de poder.
Paulo Nogueira Batista Jr. |
O
caso do reitor Cancellier me tocou particularmente, leitor. É que há algumas
semelhanças com o que eu mesmo vivenciei. Também sofri recentemente um processo
administrativo irregular e arbitrário que levou a meu afastamento da vice-presidência
no Banco do Brics em Xangai. Dou nome aos bois. A iniciativa foi de alguns
integrantes do governo brasileiro, nomeadamente do presidente do Banco Central,
Ilan Goldfajn, acolitado por Marcello Estevão, um assessor irresponsável e
bisonho do Ministro da Fazenda. Acusaram-me, sem base, de quebrar o código de
conduta, em alguns artigos publicados nesta coluna. Acusaram-me, também sem
qualquer base, de ter assediado moralmente um funcionário brasileiro, um certo
Sergio Suchodolski, cuja demissão havia recomendado por desempenho pífio no
período probatório.
Depois,
acusaram-me, sem provas, de obstruir investigações. Negaram-me o direito de
defesa. Fui condenado em uma reunião de diretoria, que ocorreu pelas minhas
costas, quando estava em viagem de trabalho. Meus funcionários foram instruídos
a não fazer qualquer contato comigo. Fui proibido de entrar no banco, e minha
sala foi lacrada.
Mas,
enfim, poderia ter sido pior. Estou vivo, com saúde, próximo à família, aos
amigos e aos correligionários. E disposto a fazer minha parte, por pequena que
possa ser, na luta contra a maré ascendente da barbárie.
Paulo Nogueira Batista Jr. é
economista e foi vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento e diretor
executivo no FMI pelo Brasil e mais dez países
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