"Iracundos das redes sociais, em vez do rancor,
deixem o computador e façam amor"
Ilustração: iStock
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O ÓDIO É UM VENENO
Parece que não é a sociologia que vai resolver isso,
mas a psicoterapia, já que não é uma questão ideológica,
mas de ego ferido por rancores vãos
Por Zuenir Ventura
O Globo – 02/12/2017
O ódio sempre existiu, inclusive entre irmãos, como o de Caim contra
Abel, relatado pela Bíblia como o primeiro homicídio da história da Humanidade.
Mas esse sentimento nunca dispôs de um instrumento tão poderoso e rápido de
disseminação quanto a internet agora.
Segundo o historiador escocês Niall Ferguson, as redes sociais
assumiram um papel tão importante e promoveram de tal maneira a radicalização
das ideias e opiniões que essa polarização raivosa se transformou em “veneno”.
Professor da Universidade de Stanford e estudioso da decadência do mundo
ocidental, ele acredita que “os Estados Unidos chegaram a um nível de declínio
que se tornaram uma sociedade não civilizada”.
Não sei se nós, brasileiros, estamos muito diferentes. A nosso
favor, não temos um presidente que já acorda com a obsessão de transmitir para
o país e o mundo sua dose diária de bílis diretamente do fígado.
E faz isso por meio dos 140 caracteres do Twitter, ou seja, em
mensagens instantâneas, recheadas de notícias falsas (as fake news) que se
dirigem não à reflexão, mas ao reflexo, incitando os baixos instintos de quem
recebe.
O Prêmio Nobel José Saramago, pensando nessa tendência para o
monossílabo como forma de comunicação, previa: “De degrau em degrau, vamos
descendo até o grunhido”.
Felizmente, não temos um Donald Trump com seus grunhidos contra
inimigos reais e inventados — o maluco da Coreia do Norte, os muçulmanos
indiscriminadamente, os imigrantes em geral e os terroristas em particular. Mas
vai ver que nós não precisamos — nós nos bastamos.
O nosso ódio já foi contra os ditadores militares, hoje se volta
contra nós mesmos. E parece que não é a sociologia que vai resolver isso, mas a
psicoterapia, já que não é uma questão ideológica, mas de ego ferido por
rancores vãos, carência, rejeição, falta de autoestima, intolerância com a
diferença.
Enquanto Ferguson diagnosticou o ódio como um veneno que ataca a
saúde — podendo afetar o sistema nervoso, a respiração, provocar desordem
emocional — o terapeuta cognitivo-comportamental Juan Antonio Picasso, que
também esteve recentemente no Brasil, para um seminário de Combate ao Estresse e à Ansiedade, receitou como antídoto o
sentimento contrário: “O único elemento que dá paz e ordem a seu cérebro é o
amor. É impossível não estar feliz se houver amor de boa qualidade”.
Portanto, iracundos das redes sociais, em vez do rancor, da raiva,
do ressentimento e da ira, deixem o computador e façam amor — de preferência
com humor.
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