terça-feira, 31 de maio de 2016

COISAS DA VIDA

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A INDIGESTÃO

(Por Violante Pimentel) Dona Francisca, com a sua mania de aproveitar as coisas, resolveu comer, à noite, umas bananas bem madurinhas, quase estragadas. Não comeu uma nem duas...Comeu  umas dez. Meia hora depois, bateu-lhe uma indigestão,  com fortes dores abdominais. Já com 70 anos, essa extravagância fez bastante mal à bondosa mulher. Nada de diarreia, nem vômito. Eram apenas dores de estômago e gases. O mal-estar fez com que Dona Francisca se deitasse na cama, esperando melhorar, após tomar um chá de boldo. Mas, nada do chá fazer efeito. O abdome parecia estar inchado. A mulher começou a ficar nervosa. Chamou Izabel, a irmã solteirona, quase da sua idade, e a parenta Idila, e disse que queria conversar com elas. As duas se sentaram ao lado da cama. Dona Francisca começou a chorar, e se dirigiu à irmã:

- Izabel, minha irmã! Sei que vou morrer! De hoje, eu não passo!!! Sinto que minhas forças estão indo embora! Essas bananas amaldiçoadas acabaram comigo! Se eu escapar, nunca mais quero ver banana na minha frente!!! Ai, meu Deus, eu vou morrer!!!

Izabel, muito franca e grosseira, começou a se irritar com a “doente”, e, para acalmá-la, respondeu:

- É isso mesmo, minha irmã! Você se conforme, porque, se chegou a sua hora de morrer, você tem que ir!!!  Ninguém pode ir no seu lugar! Quem manda no destino da gente é Deus. Pode se conformar, pois se chegou a hora, não tem jeito!!! Você vai morrer mesmo! Mas você é muito católica e vive falando que quer ir para o céu, então, bote na sua cabeça que você vai para o céu!!! Vai ver Jesus Cristo de perto!


Violante Pimentel é procuradora 
aposentada do Rio Grande do Norte

A doente não gostou das palavras da irmã. Não viu nenhuma emoção e nenhuma lágrima em seus olhos. Fechou, então, a cara para Izabel e fixou o olhar na parenta Idila, dirigindo-lhe a palavra:

-Idila, quero que você me perdoe as ingratidões que eu fiz com você! Eu me arrependo de ter sido desatenciosa e grosseira, chamando sempre você de “hóspede”, quando, na verdade, você é como uma irmã para mim! Perdão, Idila!!!

Muito malcriada, Idila não gostou do que ouviu e achou que era dramatização barata. Com o dedo indicador da mão direita em riste, apontado para Dona Francisca, respondeu, quase aos gritos:

- Olhe, Francisquinha, não me peça perdão de nada, pois você nunca me tratou mal. E se você tivesse me  tratado mal, EU TINHA REAGIDO, ouviu? Você não estava nem besta de me tratar mal. Ora bolas!!! Só o que estava faltando agora era esta encenação!!! Pois fique aí sozinha!

Izabel e Idila deixaram Dona Francisca sozinha no quarto.

Sem plateia, a mulher, muito cavilosa, levantou-se desconfiada, e meia hora depois não se queixava mais de nada.  O chá de boldo serviu...



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