quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

QUASE HISTÓRIAS

Resultado de imagem para IMAGENS CRIANÇA ABRAÇANDO CINTURA DA MÃE
ILUSTRAÇÃO: ARQUIVO GOOGLE


DEZ MINUTOS

O amontoado de minutos, que pareciam horas, foi dramático. Não sei se aqueles dez ou quinze minutos de atraso foram os piores de minha vida – de minha infância, com certeza, foram. Assim me pareceu por muito tempo. A sirene anunciara o momento de voltar para casa. Era meu primeiro dia de aula. Os portões se abriram. Mães esperavam os filhos do lado de fora. As crianças saiam correndo para abraçá-las. Cadê minha mãe? Ficamos sozinhos no pátio – eu e minha lancheira vazia -, sob o olhar impaciente de duas funcionárias. Minha mãe me abandonou? Minha mãe morreu? Angústia, pânico. Finalmente, minha mãe chegou. O abraço na cintura dela foi um dos mais gostosos que dei em minha vida.


AQUELA NÃO ERA MINHA MÃE

Ainda menino, guri pobre e guloso do Brás, ficava sempre apreensivo às vésperas de casamento de parentes ou conhecidos. Não via a hora, claro, de comer salgados, doces e tudo mais que me fosse servido. Também gostava de correr feito besta de um lado para outro do salão, com meus primos, até vomitar na roupinha nova, comprada a prazo. No dia seguinte, o puxão de orelha era certo.

Mas o que me deixava apreensivo não era o castigo físico, que, a bem da verdade, pouco doía. Era a certeza de que mamãe iria à cabeleireira, logo pela manhã do sábado (naquela época só se casava aos sábados). Que depois voltaria com uns rolos imensos na cabeça coberta por um pano qualquer.

O pior viria à tarde, quase na hora da cerimônia. Quando ela entrava em casa, com aquele capacete construído com frascos e mais frascos de laquê, era sempre um baque para mim. Meu pai não se abalava. Às vezes, chegava a lhe dizer: “Está bonita”. Acho que o pai mentia.

Aquela mulher de capacete não era minha mãe. Minha mãe era a que me buscava de cabelos lambidos e vestido ordinário, na porta da escola. Esta eu amava. Desta sinto muita saudade.

(OS – atualizado em fevereiro de 2017)



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