ILUSTRAÇÃO: ARQUIVO GOOGLE |
DEZ MINUTOS
O amontoado de minutos, que pareciam
horas, foi dramático. Não sei se aqueles dez ou quinze minutos de atraso foram
os piores de minha vida – de minha infância, com certeza, foram. Assim me pareceu
por muito tempo. A sirene anunciara o momento de voltar para casa. Era meu
primeiro dia de aula. Os portões se abriram. Mães esperavam os filhos do lado
de fora. As crianças saiam correndo para abraçá-las. Cadê minha mãe? Ficamos
sozinhos no pátio – eu e minha lancheira vazia -, sob o olhar impaciente de duas
funcionárias. Minha mãe me abandonou? Minha mãe morreu? Angústia, pânico.
Finalmente, minha mãe chegou. O abraço na cintura dela foi um dos mais gostosos
que dei em minha vida.
AQUELA NÃO ERA MINHA MÃE
Ainda menino, guri pobre e guloso do
Brás, ficava sempre apreensivo às vésperas de casamento de parentes ou
conhecidos. Não via a hora, claro, de comer salgados, doces e tudo mais que me
fosse servido. Também gostava de correr feito besta de um lado para outro do
salão, com meus primos, até vomitar na roupinha nova, comprada a prazo. No dia
seguinte, o puxão de orelha era certo.
Mas o que me deixava apreensivo não
era o castigo físico, que, a bem da verdade, pouco doía. Era a certeza de que
mamãe iria à cabeleireira, logo pela manhã do sábado (naquela época só se
casava aos sábados). Que depois voltaria com uns rolos imensos na cabeça
coberta por um pano qualquer.
O pior viria à tarde, quase na hora
da cerimônia. Quando ela entrava em casa, com aquele capacete construído com
frascos e mais frascos de laquê, era sempre um baque para mim. Meu pai não se
abalava. Às vezes, chegava a lhe dizer: “Está bonita”. Acho que o pai mentia.
Aquela mulher de capacete não era
minha mãe. Minha mãe era a que me buscava de cabelos lambidos e vestido
ordinário, na porta da escola. Esta eu amava. Desta sinto muita saudade.
(OS – atualizado em fevereiro de 2017)
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