A BELA ADORMECIDA
Estou alegre e o motivo beira secretamente à humilhação,
porque aos 50 anos não posso mais fazer curso de dança,
escolher profissão, aprender a nadar como se deve.
No entanto, não sei se é por causa das águas,
deste ar que desentoca do chão as formigas aladas,
ou se é por causa dele
que volta e põe tudo arcaico,
como a matéria da alma, se você
vai ao pasto,
se você olha o céu, aquelas frutinhas travosas,
aquela estrelinha nova, sabe que nada mudou.
O pai está vivo e tosse,
a mãe pragueja sem raiva na cozinha.
Assim que escurecer vou namorar.
Que mundo ordenado e bom!
Namorar quem?
Minha alma nasceu desposada
com um marido invisível.
Quando ele fala roreja
quando ele vem eu sei,
porque as hastes se inclinam.
Eu fico tão atenta que adormeço
a cada ano mais.
Sob juramento lhes digo: tenho
18 anos.
Incompletos.
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Há momentos em que o olhar vago nada vê,
exceto o passado em preto e branco.
Por Orlando Silveira, em "Rapidíssimas"
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