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QUERIDA VOVÓ
Os
óculos de lentes grossas, tipo fundo de garrafa, como se dizia naqueles tempos,
tinham pouca (ou nenhuma) serventia. A avó era praticamente cega – cega
teimosa, cega irrequieta. Inútil lhe pedir para que não andasse sozinha pela
casa. Tanto fez, até que caiu, quebrou o fêmur, ficou internada por bom tempo.
Mas era dura na queda, ainda bem. Voltou pra casa, mais teimosa que nunca. Que
lástima.
Um
dia, ela se levantou e saiu perambulando pelo corredor. Deixou pelo caminho um
rastro de destruição. Dizimou com seus pés igualmente cegos e pesados os dois
times de futebol de mesa do neto. A mãe prometeu ao filho que, assim que
pudesse, compraria outros botões. Que por ora brincasse com as bolinhas de
gude. Quem mandou deixar os botões no chão? Inútil argumentar que a mesa da
cozinha estava sempre ocupada. Onde colocar o campinho?
Sabedor
que comprar times de botões não era prioridade da mãe – o dinheiro, sempre
curto –, começou a brincar com as bolinhas de gude. Toda vez que ele via o
campinho vazio, sem jogadores, tinha vontade chorar. Toda vez que ele via a avó
zanzando pela casa, olhava para as bolinhas de gude. E lamentava não ter
estilingue. (OS)
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