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CORDILHEIRAS (*)
(Por Otávio Nunes) Quero
ser o comandante que humilha seus soldados e elogia os farsantes e covardes.
Levarei meus pelotões propositalmente, aos poucos, para enfrentar um inimigo
dez vezes mais poderoso, até que o último de meus combatentes caia a meus pés,
clamando piedade.
Pretendo
usurpar o recém-nascido do colo da mãe, enquanto mama. Direi à pobre mulher que
presto favor a ambos ao evitar um futuro incerto da criança, crescendo ao lado
dela, e os aborrecimentos que traz um filho a quem o gerou.
Minha
idéia é substituir a língua e a cultura deste povo infeliz por outras de uma
sociedade bem distante, mais evoluída. Transformarei esta terra inútil numa
colônia subserviente que abaixe a cabeça sempre que o dominador passar, sem
pedir licença.
Submeterei
os moços ao poder dos velhos. Farei com que a juventude se torne um exército de
aflitos e errantes na vida.
OTÁVIO NUNES É JORNALISTA |
Levarei
a cabo experiência para adaptar os peixes à terra firme. Despovoarei lagos,
rios e mares para provar que estes seres aquáticos só irão evoluir quando
deixar a água.
Quero
ter a mesma sensação das cordilheiras ao desabar sua aridez e seu gelo sobre as
flores inocentes e rasteiras que teimam em crescer nos desvãos da rocha. Irei
me divertir com o desespero da presa nas garras do predador.
Pretendo
apenas ser cruel e algoz, naturalmente. Descerei aos porões, ao mundo abissal.
Pisarei no lodo e atravessarei pântanos. Quero descobrir onde o mal nasce e
destruir sua nefasta semente. (Otávio
Nunes)
(*) Crônica baseada na
música homônima de Paulo César Pinheiro e Sueli Costa, gravada por Simone, em
1979.
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