JOSÉ SARAMAGO/INTERNET |
EXPRESSÕES DO MEU TEMPO
(Por Clóvis Campêlo) Logo
que casei e a minha mulher ainda estava impregnada pelo “maranhês”, a língua
popular que se fala no interior do Estado do Maranhão, gostava de utilizar uma
expressão que tanto podia significar coisas boas como coisas ruins: “Adeus, tia
Chica!”. Uma expressão mais ou menos como o “arretado” pernambucano. Assim,
acontecesse algo positivo, logo vinha o “Adeus, tia Chica” dela e o meu
“arretado” de aprovação. A mesma coisa para os fatos negativos: as duas
expressões se aplicavam da mesma forma. Hoje, depois de 37 anos, quando ela já
está impregnada pelo “pernambuquês” do Recife, o “Valeu, tia Chica!” foi
substituído definitivamente pelo “arretado”. Coisas da adaptação cultural de
cada um.
Todo
esse preâmbulo (ou será uma digressão?) serve para lembrar a expressão
“conscientizar” que usávamos no grupo Juventude Unida de Brasília e Pina, o
Jubrapi, no Pina da minha adolescência, quando nos referíamos à suposta
ignorância política em que vivia o povo brasileiro daquele tempo.
Éramos
pretensiosos. Achávamos que tínhamos a solução política para aquela população
que, de uma forma ou de outra, vivia feliz e isenta de angústias políticas.
Havia uma ditadura militar? E daí? Havia também uma praia maravilhosa para que
os jovens pobres ou remediados da periferia exercitassem o futebol, a pesca e o
namoro. Teriam coisas melhores do que isso?
Mas,
insistíamos na tese e na prática de que quando o povo tomasse conhecimento dos
absurdos do capital e da mirabolância do marxismo, o mundo seria outro, bem
mais justo e equânime. Assim vivi a contradição juvenil de dividir-me entre os
prazeres da vida na praia e as obrigações da militância no salão paroquial da
igreja. Porém, foi nessa época que conheci pessoas com as quais mantenho uma
relação sincera de amizade até os dias de hoje. Ao menos, restou algo
consistente e prazeiroso.
CLÓVIS CAMPÊLO |
Alguns
desses amigos, hoje, nem mesmo mais professam o credo marxista/socialista.
Alguns até, defendem teses opostas liberais em nome de um mercado evolutivo e
que ao mesmo tempo se auto regule, Embora nem sempre concorde, não deixo de
achar interessante e respeitar. Outros negaram e renegaram o passado,
mergulhando num auto exílio nem sempre agradável ou criativo. Talvez, estes
sejam os mais doentes...
Nessa
primeira fase, acreditava que o éden estava aqui e que dependia apenas de uma
nova organização cósmica para manifestar a sua eficiência e consequências.
Uma
outra expressão do meu tempo, e que perdura até hoje, era “fazer a cabeça”. Ou
seja, depois de Marx e Engels, um pouco de Jimi Hendrix e Janis Joplin, a
revolução ainda ocidentalizada do prazer e da libertação. “Fazer a cabeça” era
abrir mão de um estado sólido de consciência e experimentar as possibilidades
de novos experimentos físicos e químicos. “Are you experience?”, perguntava-nos
Jimi Hendrix e quem não se arriscasse e encarasse essa onda, era boko moko e
careta.
Recentemente,
leio na internet uma frase do escritor português José Saramago, onde ele
explicita que nunca tentou transformar ideologicamente alguém, por achar que
essa atitude também é um ato de colonialismo político e cultural.
Grande
visão, grande Saramago! Devia ter te conhecido há mais tempo quando as erupções
da juventude me levaram por caminhos nem sempre coerentes.
Recife,
agosto 2015
Nenhum comentário:
Postar um comentário