sexta-feira, 24 de abril de 2015

NEM TODA MENTIRA SERÁ CASTIGADA

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Dizem que mentira é coisa feia e tem pernas curtas. Não é bem assim. Todos nós conhecemos pessoas, políticos à frente, que mentem compulsivamente – e que vão longe. Não faz muito tempo, um mitômano chegou à presidência da República. Outros tantos, ainda que não saibam uma palavra em javanês, prosperam igual e celeremente. Vendendo aos incautos os conhecimentos que nunca tiveram de javanês.

Sejamos francos: em certas situações, não há como fugir da mentira, daquela mentirinha que pessoas sem senso de ridículo nos obrigam a contar. Imagine sua sogra, que já ultrapassou os limites da obesidade mórbida, dirigindo-se a você, com aquele corpanzil roliço coberto por um vestido estampado, quase aberrante:   

— Então, Juninho, sua sogra está ou não está elegante, bonitona?

Refreie seus instintos mais primitivos. Sinceridade, ao contrário do que dizem, nem sempre é boa conselheira. Concorde. Mas, tudo o que você, Juninho, disser além de “claro, claro” soará aos ouvidos de sua sogra como ofensa irreparável. Minta, mas seja discreto. Nada de elogios rasgados. Ela sabe que, com o “claro, claro”, você está mentindo. Afinal, ela não é tola de tudo. Jamais suportaria, no entanto, o deboche. Nada de “bonitona é pouco” ou mesuras afins.

A desgraça é que há pessoas que mentem sem necessidade alguma. Deveriam ficar caladas. Seja honesto: sem contar seus filhos, evidentemente, você já viu algum recém-nascido lindo, que seja de fato a cara do pai, da mãe ou do vizinho? O que temos ali, após o parto, é uma massa disforme que leva obstetras em início de carreira a ter uma dúvida das bravas: afinal, qual é a placenta?

Os extremos se tocam. Velórios são também espaços propícios para mentiras desnecessárias. Ora, todo mundo sabe que o cara foi um crápula a vida toda, teve casos e mais casos, bebia e fumava sem descontinuar, fugia do batente como aquele presidente dos livros etc. e tal. Aí, sempre aparece alguém para dizer, com ares de carpideira, para a pobre da viúva – justo para ela, que agora sonha com um fim de vida em paz: “Foi um homem bom, ninguém pode negar”.

Resumo da ópera: se for preciso, não houver mesmo outro jeito, minta, mas sem exageros. 

(maio de 2013)



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