sexta-feira, 24 de abril de 2015

BRUNO NEGROMONTE

CARTAS E CONFISSÕES EM FORMA DE CANÇÕES NA VOZ DE CECILIA BERNARDES
Em seu trabalho de estreia a cantora e compositora Cecilia Bernardes conta com a participação de nomes da cena musical paulista contemporânea
Em um país de canto predominantemente feminino destaca-se aquela cantora que vai além da interpretação; seja empunhando um instrumento e o tocando de modo convincente ou até mesmo escrevendo versos e melodias. Em nosso país-continente pouco são aquelas que aventuram-se fazer isso e quando o fazem muitas vezes ficam a desejar seja em um ou em outro aspecto. Talvez por não possuir esta lacuna em sua arte a artista em questão mereça uma maior atenção uma vez que suas letras e melodias superam todas as expectativas depositadas. Paulista, Cecilia Bernardes vem divulgando e recebendo os mais diversos elogios deste seu primeiro disco, um projeto fonográfico que a julgar pela adesão de relevantes nomes do cenário musical brasileiro não há como titubear que trata-se de um projeto de grande qualidade. Cantora e compositora, Bernardes vem desde 2007, mesmo que de modo inconsciente, concebendo este álbum a princípio a partir da concepção de melodias para uma série de letras do poeta e compositor Luciano Garcez. Desde então o seu lado compositora vem aflorando de modo cada vez mais constante e intenso, não apenas na medida em que a parceria com Garcez expande-se mas também na aquisição de novos parceiros como foi o caso da parceria com a cantora, multi-instrumentista, produtora e compositora Natalia Mallo (que Cecilia conheceu via internet a partir da audição do álbum "Qualquer Lugar"). O que a princípio seria apenas uma hipótese acabou gerando a possibilidade do surgimento de algumas composições e propiciando a artista o contexto ideal para que ela possa dar vazão ao seu universo particular de modo bastante melódico e poético.

É neste contexto que surge "Carta", um álbum constituído sem a habitual pressa que cerca a sociedade contemporânea. Um projeto bordado por timbres e sonoridades que entrelaçam-se de modo bastante harmonioso, dando ao projeto características bastante peculiares e pessoais. Trata-se de trabalho cosido com a linha da paciência, onde cada acorde e cada sílaba pronunciada resulta da maturação de ideias e melodias precisas e que resultam de uma série de experiências acumuladas ao longo dos anos do seu envolvimento com a música e a poesia. Sob a produção de Natalia Mallo (que também assina a direção musical do disco) "Carta" começou a ganhar molde em 2008, no coração da Vila Madalena, e foi concluído três anos depois. Com o delicado registro fotográfico de Carol Sachs e ilustrações da própriaCecilia feitas em nanquim entre os anos de 2007 e 2008, o álbum conta ainda com o design gráfico dePaola Faoro e nomes como Luciano Garcez (locução), Ramiro Murillo (arranjos para cello e oboé),Marisa Silveira (cello), Laura Sokolowicz (oboé), Natalia Mallo (arranjos, percussão, palmas, guitarra, baixo, vocais, violões, sintetizador); Maurício Pereira (sax soprano), Gustavo Ruiz (violão de 7 cordas), Danilo Penteado (teclado, vocais, cavaquinho e palmas), Vitor Lopes (gaita), Mariá Portugal (bateria), Emerson Villani (violão, guitarra e programação), Rogerio Botter Maio (baixo acústico), Edu Contrera (percussão) e os vocais de Ilana Volcov, Marko Congá, Marco Bowie,Vanessa Bumagny. Além desses nomes há também Ricardo Mosca e Homero Lotito, que assumem, respectivamente, a mixagem e a masterização. Além das figuras de Sérgio Bártolo (produção e baixo em "Me nina"; além da concepção do arranjo, baixo e co-produção em "De novo nova") e André Abujamra (produção em "Santo Seio", além de todos os instrumentos e programações).
"Carta" é constituído por onze faixas caracterizada por toda a poesia e delicadeza exposta neste trabalho que perpassam por canções de autoria da própria Cecilia e de pessoas com a qual a artista identifica a sua arte de algum modo como a faixa "Truques com Facas", de Maurício Pereira e "Onda", canção que nos remete a sonoridade da cultura afro-brasileira através de seus pontos e que foi composta por Luciano Garcez. O projeto conta ainda com canções autorais como "Castelo", "De novo nova" e "Passarinho", além do envolvente samba "Oferenda", que conta com Claudio Faria ao trompete, e parcerias da artista com nomes como Natalia Mallo (que juntas assinam "Carta", canção que batiza o disco) e Luciano Garcez (como "Pop me", parceria responsável pelo pontapé inicial desta profícua parceria, "Santo seio"e ''Ave Maria").
De modo agradável e convincente, Cecilia Bernardes apresenta nesta carta pra lá de confessional (e porque não classificá-la até mesmo de onírica) uma arrojada sonoridade caracterizada por harmoniosos e precisos arranjos. O universo sonoro que a constitui alia-se a peculiaridades e assuntos cotidianos em letras e melodias que se encaixam de modo uníssono, gerando as mais diversas possibilidades de caminho ao mais genuíno prazer sonoro. Soma-se a este cenário o doce e afinado canto da artista que passeia de modo pra lá de harmonioso por toda a diversidade sonora presente no álbum facilitando a capacidade do ouvinte sorver todo o hibridismo presente neste aprazível álbum. Ao se descobrir compositora, Cecilia, que já empunhava despretensiosamente seu instrumento, descobriu uma preciosa passagem que a levaria a um mundo de poesia e lirismo e possibilitaria também o encontro com outros nomes como todos aqueles presentes e citados neste projeto ímpar. Esta característica acaba fazendo de "Carta" um registro pontuado não apenas por sua qualidade lítero-musical, mas também por uma característica que faz-se bastante pertinente a julgar-se pelo espírito agregador que caracteriza esta cantora paulista. É por este e outros motivos que este debute fonográfico chega não apenas para revelar o talento de Cecilia como cantora mas também para atestar que o árduo ofício de compor rendeu-lhe bons resultados e o seu canto acaba por permear os mais recônditos sonhos ao adentrar nossos ouvidos tal qual o lendário canto da sereia. Cecilia Bernardes soube administrar todo o tempo de elaboração deste álbum, não apenas procurando estar a par de toda a sua elaboração, mas também por demostrar bastante segurança neste seu primeiro álbum. Apesar das inúmeras parcerias, sem dúvida alguma para este disco o tempo foi o seu principal aliado neste cenário constituído por versos e canções.
Deixo aqui para audição dos amigos leitores duas canções presentes neste debute fonográfico da artista, mas que aqui ganharam versões ao vivo. A primeira trata-se de "Ave Maria", canção composta pela cantora em parceria com Luciano Garcez: A segunda canção trata-se de "Carta", canção homônima ao título do disco:

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