sábado, 4 de abril de 2015

JÁ VAI TARDE, GEROLINA

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Foram anos e mais meses, semanas, dias e horas de discórdia e ingratidão. Você ameaçando ir embora com esse, com aquele, com o primeiro que lhe galopasse. Ameaçando ir embora sem os filhos no colo. Eu com as crianças no chão. Só. 

Bota angústia nisso.

Foram anos, Gerô. Foram anos.

Aflito, coração nos pés, sofri, por décadas, a dor da separação que não vinha. 
Só ameaças, maledicências. Sofrimento inútil.  

E por que, Gerô, a separação?

Por conveniência sua:

O mundo lá fora é difícil, custa caro, só tem valor quem tem dinheiro, não importa de onde o dinheiro venha. Pude lhe dar pouco. Sei de suas mágoas, peitos pequenos e murchos, mas quem pode pagar enxerto, internação e tudo mais, ganhando o que ganho? Ainda que não tivesse bebido a vida toda, não tivesse botado um puto de um cigarro na boca, não teria dinheiro para lhe comprar um “bico” importado.

 Por safadeza sua:

Não se faz isso, faz não, Gerô, com um homem frágil, inseguro, mas honesto e trabalhador, e que tanto te amou.

Hoje, sei que você vai amanhã.

Vi a mala pronta e bilhete do ônibus na caixinha onde você guarda suas bijuterias e santinhos.

Vá com Deus, mas vá mesmo. Obrigado por me ensinar a não sofrer mais.

Não precisa levar os santinhos, reze.

Ascenso



Um comentário:

  1. Ótima crônica, Orlando Silveira! Gerolina pintou e bordou com o marido, e ele aguentou, porque também não era santo... Agora chegou a hora..."Vá com Deus"!!! Feliz Páscoa!

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