terça-feira, 31 de março de 2015

O FREVO DE RUA


O frevo é pernambucano e nasceu pelas ruas do Recife, misturando polca, dobrados, maxixes, tangos e quadrilhas.

O frevo é pernambucano e degenerou-se a partir das bandas marciais que existiam no Recife no século XIX.

O frevo é pernambucano e teve a sua paternidade concebida pela banda do 4º Batalhão de Artilharia, o Quarto, e pela banda da Guarda Nacional, a Espanha de Pedro Garrido.

O frevo é pernambucano e na sua concepção despretensiosa e natural ousou misturar a dança e a música.

O frevo é eminetemente urbano.

Quem diz isso não sou eu. São vários pesquisadores, pernambucanos ou não. Entre eles, José Ramos Tinhorão.

No frevo, os dobrados desdobraram-se e foram sendo acelerados. Primeiro, os passos dos capoeiristas que acompanhavam as bandas e disputavam os espaços das ruas. Depois, as notas musicais, mais rápidas, mais curtas e mais altas. O frevo tomava corpo e forma. O frevo mostrava a alma.

O frevo sempre foi do povo. Primeiro do lumpen que acompanhava as orquestras. Depois, dos trabalhadores urbanos mais organizados.


CLÓVIS CAMPÊLO


Acompanhemos Tinhorão:

"Até o início do século XX, as marchas que começavam a ser frevos, antes mesmo do aparecimento desse nome, ainda não possuíam o caráter explosivo que o frevo de rua adotaria posteriormente. Quando, porém, a partir do início do século, são rompidas as relações urbanas algo feudais do Recife pela presença das indústrias têxtil e açucareira, e a cidade se enche de novas camadas de trabalhadores procedentes da zona rural, dissociados das tradições locais, esses moradores de mocambos da zona alagada permitem o advento do frevo de rua estritamente orquestral, destinado pura e simplesmente à cega libertação de energia dos pés-de-poeira.

Para a música produzida pelas fanfarras em suas passeatas carnavalescas isso queria dizer que não havia mais qualquer compromisso com o repertório ora marcial, ora foclórico herdado do século XIX, e os metais podiam enfim explodir em colcheias e semicolcheias nas introduções que desenhavam uma melodia marcada por síncopas, enquanto o ritmo, desprezando as medidas de tempo, produzia a ginga visivelmente inspirada nas desarticulações do corpo dos dançarinos entregues à loucura do passo."

Ou seja, o povo criou o frevo e o povo o libertou das amarras iniciais. O frevo sempre foi do povo. E, passo a passo, a liberdade do passo foi sendo inventada, ordenada e consentida. O frevo sempre foi liberdade.

Falo do frevo de rua, é claro, e dentro das concepções do crítico e estudioso paulista. As opiniões de Tinhorão estão no livro Pequena história da música popular (Ed. Vozes, Petrópolis, 1974, pág. 137/146). São interessantes e polêmicas quando trata de analisar as outras modalidades do frevo (frevo-canção e frevo-de-bloco)...

Portanto, agora, quando novamente se aproxima o carnaval, vale a pena lembrarmos do ritmo autenticamente pernambucano.

Por enquanto, porém, falemos da invenção e das evoluções do frevo de rua, o frevo que encantou Tinhorão.

O resto virá depois. (CC)




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