sexta-feira, 11 de abril de 2014

CHÁ DAS CINCO: DALTON TREVISAN

AH, É?
(ministórias)




01

Domingo inteiro em pijama, coça o umbigo. Diverte-se com os pequenos anúncios. Em sossego na poltrona, entende as borbulhas do gelo no copo de bebida. Uma velhice tranqüila, regando suas malvas à janela, em manga de camisa. Única dúvida: ganhará o concurso de palavras cruzadas?

02

Rataplã é o gato siamês. Olho todo azul. Magro de tão libidinoso.  Pior que um piá de mão no bolso. Vive no colo, se esfrega e ronrona.

— Você não acredita. Se eu ralho, sai lágrima azul daquele olho.

Hora de sua volta do colégio, ele trepa na cadeira e salta na janela.  Ali à espera, batendo o rabinho na vidraça.

Doente incurável. O veterinário propõe sacrificá-lo. A moça deita-o no colo. Ela mesma enfia a agulha na patinha. E ficam se olhando até o último suspiro nos seus braços. Nem quando o pai se foi ela sentiu tanto.

03

Ao tirar a calcinha, ele rasga.   Puxa com força e rasga.   Vai por cima.  Ó mãezinha, e agora? Com falta de ar, afogueada, lavada de suor.  Reza que fique por isso mesmo.

Chorando, suando, tremendo, o coração tosse no joelho. Ele a beija da cabeça ao pé — mil asas de borboleta à flor da pele. O medo já não é tanto. Ainda bem só aquilo.  Perdido nas voltas de sua coxa, beija o umbiguinho.

Deita-se sobre ela — e entra nela. Que dá um berro de agonia: o cigarro aceso na palma da mão. Mas você pára?  Nem ele.

04

Só de vê-la — ó doçura do quindim se derretendo sem morder — o arrepio lancinante no céu da boca.





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