RADIOGRAFIA DE UMA FRAUDE (FIM)
A CANDIDATA
DILMA VOTANDO EM PORTO ALEGRE (2010) |
O PAÍS EM QUE DILMA VIVE
TEM ATÉ TREM BALA
O Brasil real não conheceu nenhuma obra notável
concluída pela ministra. O país registrado em cartório
por Lula e Dilma inaugurou um deslumbramento por mês
Por Augusto Nunes
VEJA.COM – 16/05/2007
Num dos incontáveis comícios promovidos para celebrar o bom ritmo de
obras que nunca ficam prontas, o presidente Lula informou que o trem-bala
prometido para aquele ano teria de esperar um pouco mais. “É uma coisa muito
grande, mas está tudo mais ou menos encaminhado e a licitação vai ser feita em
outubro”, avisou em 26 de abril de 2008.
De onde viriam os R$ 9 bilhões que serão engolidos pela maravilha
ferroviária ligando o Rio a São Paulo e Campinas? Lula replicou com um sorriso
superior e outra bazófia: “Neste momento, a companheira Dilma está no Japão e
na Coreia mostrando o projeto para países mais ricos e empresas que têm
tecnologia, a fim de participarem junto do consórcio de empresas brasileiras”.
Era esperar pela viagem de volta e correr para o abraço.
A licitação prometida para outubro, que permitiria ouvir o apito na
curva até o fim de 2012, já completou nove anos de inexistência. Em 4 de
dezembro de 2009, Dilma baixou em Berlim para prosseguir a missão iniciada no
Japão e na Coreia. Pronta para embarcar num trem-bala alemão, transferiu a
viagem inaugural do similar brasileiro para 2014. “Antes da Copa do Mundo do
Brasil”, animou-se.
A coisa demoraria, mas em compensação ficaria maior, soube o país na
continuação da discurseira: “A gente
exige transferência de tecnologia, porque esse é o primeiro trem. Você tem
outras possibilidades de construção de trens de alta velocidade no país”. Em
seguida, Dilma presenteou com trens-balas também os eleitores de Curitiba,
Brasília e Belo Horizonte.
O Brasil real não conheceu nenhuma obra notável concluída pela
ministra. O Brasil registrado em cartório por Lula e herdado por Dilma
inaugurou um deslumbramento por mês. Lá a vida é uma beleza. Lá se vive como
rei. Lá a pobreza é uma lembrança tão longínqua, tão remota que os pobres já nem
se lembram dos tempos em que faltava dinheiro para comprar passagens de avião.
Lá há aeroportos de sobra, e só São Paulo tem três.
O terceiro começou a tomar forma em 20 de julho de 2007, quando
Dilma descobriu como acabar com apagões e desastres. “Determinamos a construção
de um novo aeroporto e os estudos ficarão prontos em 90 dias”, pisou fundo já
na largada da entrevista coletiva, caprichando no plural majestático. “Estamos
determinando que a vocação de Congonhas seja de voos diretos, ponto a ponto”.
Como conexões e voos internacionais seriam banidos de Congonhas “em
60 dias”, não havia tempo a perder. Nenhum detalhe escapara à astúcia da Mãe do
PAC. “Tivemos de tomar precauções sobre a área de segurança ao redor do
aeroporto”, exemplificou. Onde seria construído o mais confortável e mais
seguro aeroporto do planeta?, excitaram-se os jornalistas. “Não sabemos onde
será e, se soubéssemos, não diríamos”, ensinou a superexecutiva a serviço da
pátria. “Jamais iríamos dizer isso para não sermos fontes de especulação
imobiliária”.
Dilma Rousseff trucida a realidade com tanta aplicação que parece
mais convincente mentindo do que dizendo a verdade. No começo de julho de 2008, por exemplo,
declarou com a convicção ensaiada de uma espiã de cinema que nada teve a ver
com a venda da Variglog a um fundo americano e três sócios brasileiros. Claro
que teve, insistiu a ex-diretora da Anac Denize Abreu.
Segundo Denize, Dilma havia interferido nas negociações em favor do
corretor de luxo Roberto Teixeira, primeiro-compadre e especialista em ganhar
muito dinheiro no céu com transações subterrâneas. Denize mentiu, cortou a
ministra. O amigo do presidente jamais dera as caras na Casa Civil. Só em 26 de
julho, depois de resistir por 20 dias à procissão de evidências, provas e
testemunhos, admitiu que haviam ocorrido dois encontros fora da agenda.
“Mas não conversamos sobre a venda da Variglog”, ressalvou. Do que
haviam tratado, então? Dilma safou-se da zona de sombra tirando da bolsa a
frase da moda no Planalto: “Isso é a escandalização do nada”.
Em agosto de 2009, foi a vez de Lina Vieira, ex-secretária da
Receita Federal, enxergar um escândalo onde Dilma Rousseff não viu nada.
Demitida do cargo por acreditar que a lei valia também para a família Sarney,
Lina contou que foi convidada para um encontro com Dilma na Casa Civil. A
secretária-executiva Erenice Guerra transmitiu pessoalmente o convite a Iraneth
Weller, chefe de gabinete da Secretaria da Receita Federal.
“Foi uma conversa muito rápida, não durou dez minutos”, resumiu
Lina. “Falamos sobre algumas amenidades e, então, Dilma me perguntou se eu
podia agilizar a fiscalização do filho de Sarney”. Dilma seguiu jurando que o
encontro não existiu. Erenice jurou que o convite não foi feito. Iraneth disse
o contrário. Ouvida no Senado, Lina deu todos os indícios de que tinha razão.
Contou que foi até a reunião no carro dirigido por um motorista do
Ministério da Fazenda, seu nome foi anotado na garagem, subiu pelo elevador,
passou por dois funcionários da Casa Civil quando caminhava rumo ao gabinete de
Dilma. “Não sou fantasma”, alertou, lembrando que o circuito interno de imagens
podia comprovar o encontro.
Não podia, descobriu-se depois. Em nota oficial, o Gabinete de
Segurança Institucional explicou que, “conforme as especificações do edital
assinado em 2004, o período médio de armazenamento das imagens varia em torno
de 30 dias”, garantiu o texto. Ao obter uma cópia do edital, o site Contas
Abertas comprovou a farsa. De acordo com o documento, ficou estabelecido que os
registros de acesso de pessoas e veículos ao Palácio do Planalto seriam
guardados “em um banco de dados específico, com capacidade de armazenamento por
um período mínimo de seis meses” ─ e depois “transferidos definitivamente para
uma unidade de backup”.
Dois meses depois, a ex-secretária localizou a agenda que apontava a
data exata do encontro, 9 de outubro de 2008, com o seguinte comentário: “Dar
retorno à ministra sobre família Sarney”. Dilma continuou rebatendo a
declaração de Lina, e o encontro nunca foi provado. Em julho de 2010, um
ex-funcionário do Planalto afirmou a Veja que o Gabinete de Segurança
Institucional (GSI) da Presidência da República escondeu imagens das câmaras de
segurança que comprovariam a reunião.
A passagem de Dilma pela Casa Civil já havia produzido outros
momentos abjetos. Em março de 2008, por exemplo, instruída para livrar o
governo da enrascada em que se metera com a gastança dos cartões corporativos
usados por ministros do governo Lula com fins nada republicanos, Dilma produziu
um papelório que tentava reduzir Fernando Henrique e Ruth Cardoso a perdulários
incuráveis, uma dupla decidida a desperdiçar o dinheiro da nação em vinhos
caros e futilidades gastronômicas. O dossiê foi produzido a mando de Erenice
Guerra, secretária-executiva da Casa Civil e braço direito da então ministra.
Diante da repercussão negativa do episódio até entre os maiores inimigos de
FHC, Dilma, que sempre preferiu se referir ao material como “banco de dados”,
ligou pessoalmente para pedir desculpas a Ruth Cardoso.
Em setembro de 2010, Erenice Guerra voltou às manchetes
político-policiais depois que outra reportagem de Veja revelou uma rede de
negociatas funcionando dentro da Casa Civil, sob a tutela de seu filho, Israel
Guerra, e outros sócios. Segundo a denúncia, o bando usava a influência de
Erenice, que havia assumido a pasta em abril daquele ano, para favorecer
empresários em troca de uma “taxa de sucesso”. O que não ia para o bolso dos
lobistas de araque, seguia para os cofres do PT. A ministra também aproveitou o
cargo para favorecer os negócios do marido e de irmãos. Diante do escândalo, a
melhor amiga de Dilma Rousseff foi despejada do emprego cinco meses depois de
empossada.
Sem saber atirar, Dilma Rousseff virou modelo de guerrilheira. Sem
passar pela Assembleia Legislativa, virou secretária de Estado. Sem estagiar no
Congresso, virou ministra. Sem ter inaugurado nada de relevante, virou
supergerente e mãe do PAC. Sem saber juntar sujeito e predicado, virou estrela
de palanque. Sem ter disputado sequer uma eleição de síndico, virou presidente
da República.
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