quinta-feira, 25 de maio de 2017

CRÔNICA: WALCYR CARRASCO


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UM NOVO ESTILO DE VIDA

Às vezes me sinto como um caramujo com uma casa
gigante nas costas. Quero ser mais prático e simples

Por Walcyr Carrasco
Época digital – 12/05/2017

Jantei com uma amiga famosa: a atriz e jornalista Marília Gabriela. De uns anos para cá, ela mudou radicalmente o estilo de vida. Já não compra roupas como antes, a não ser eventualmente uma peça que lhe chame bastante a atenção. Vendeu o apartamento em Nova York e a casa em Campos do Jordão. Em trabalho, só faz aquilo que gosta, que lhe é visceral. Atualmente faz a peça Constelações, de Nick Payne, com o ator Caco Ciocler, no teatro Tucarena, em São Paulo. Gabi, como é conhecida, já teve uma ofuscante vida social. A mudança, hoje, não é devida a problemas financeiros. Ela vai muito bem, obrigada. Mas a uma nova postura de vida. Não se trata de uma vida espartana. Mas da busca da felicidade fora do consumismo. Li recentemente uma reportagem, na revista GQ americana, em que o jornalista Sean Hotchkiss conta que teve um encontro de uma noite, após uns drinques. De manhã, ela pareceu estranha. Perguntou por quê. A resposta:

– Como você tem mais roupas que qualquer garota que eu conheço? E nenhuma TV?!

Ela foi embora, deixando uma estranha sensação. O rapaz observou seu closet gigante. Iniciou uma transformação. Gosta de ser fashion e mantém isso. Mas com menos. Vendeu e doou roupas antigas. Passou a usar só preto, cinza, branco e azul. Assim, todas as peças combinam. Finalmente... mudou-se para um apartamento sem closet! Eu também sinto essa necessidade de restringir. Há anos criei uma necessidade feroz de comprar roupas. Até recentemente, eu era o delírio dos vendedores. Bastava eu entrar na loja, e já comemoravam. Iam bater a meta.

O mais estranho nesse tipo de comportamento é acreditar inteiramente no vendedor, como se aos olhos dele eu me transformasse no Brad Pitt! Ao provar a peça, ele sempre me dirá:

– Ficou ótimo.

Mesmo que me engorde!

Quando a fatura do meu cartão de crédito bateu nas alturas, resolvi fazer algo a respeito (e nunca vou parecer o Brad Pitt, ok?). Optei por um tratamento com um coach (um tipo de consultor pessoal) para diminuir meu impulso consumista. Resultado surpreendente. Após algumas sessões com a Madalena, minha coach, algo mudou. No final do ano, fui comprar camiseta e bermuda brancas para o Réveillon. Entrei numa loja de uma das grifes que mais gosto. Só na volta, percebi: não me interessara pelos casacos e outras peças. Havia me concentrado na camiseta. E parei de consumir de forma devastadora. Até hoje vendedores me convidam para “tomar um café”. Respondo que estou tentando zerar meu cartão de crédito. Insistem:

– Só um café...

Estratégia. Tenho meus problemas psicológicos, meus traumas. Mas minha carência não chega a tanto. Não confundo tentativa de venda com amizade. Um grande amigo que também é vendedor costumava, entre mensagens normais, enviar fotos das peças novas, pelas quais eu podia me interessar. Pedi:

– Agora você vai decidir se é meu amigo ou está trabalhando. Se o interesse é pessoal, pare de enviar fotos de roupas!

“É um novo estilo de vida, em expansão. Resume-se
a uma simples frase: ter menos, para possuir mais”

Essas percepções e atitudes estão me ajudando a economizar bastante. Ainda não resolvi a questão dos livros. Sou voraz. Compro mais do que leio. Chegarei lá, já comecei a fazer belas doações a bibliotecas. Uma delas fica numa comunidade paulistana. Já levou caixas e caixas de livros.

Para que tanto, afinal?

Às vezes me sinto como um caramujo carregando uma casa gigantesca nas costas. Há uma questão de status. Quando se começa a buscar menos, as pessoas acham que se está em má situação financeira. E daí? Não estou em crise. Mas se estivesse não seria vergonha nenhuma. Daqui a pouco seleciono meus casacos e vendo pela internet. Ou doo. Ser prático e simples, eis a questão.

A pioneira dessa atitude de vida foi Danuza Leão, que além de escritora exerceu inúmeras atividades, todas com sucesso. Ainda lembro que em um de seus livros aconselhava a servir a mesa com copos diferentes. Óbvio. É quase impossível ter um jogo de taças em que uma não quebre, outra não lasque. Melhor assumir e misturar, do que gastar grana na caça de mais outro e outro. Como simplificar a vida é uma bandeira nos livros de Danuza.

Um amigo meu, suíço, Pierre, produtor de cinema, mudou-se para um apartamento de dois quartos. Poderia viver em lugar bem maior. Simplesmente, assim é mais prático para cuidar.

– Eu vivo com o necessário.

É um novo estilo de vida, em expansão. Resume-se a uma simples frase: ter menos, para possuir mais.

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MORRO ABAIXO: Bons tempos aqueles de sobe e desce ladeira. 
Na pior idade, a mão é única. 
Por Orlando Silveira, em "Rapidíssimas". No blog.
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