FOTO: ARQUIVO GOOGLE |
CHARUTO PERDIDO
POR CARLOS HEITOR CONY
UOL
– 07/06/2005
Todos sabem que o Rio é o paraíso das
balas pedidas. Não há dia em que não morre alguém por causa delas. Não apenas
nas ruas, mas até mesmo dentro de casa, que a Constituição em vigor considera o
"abrigo inviolável do cidadão".
Por falar em cidadão, sempre me
considerei um exemplar abominável da espécie. Detesto tudo o que é
politicamente correto mas procuro não ser mal educado --o que nem sempre
consigo. E aí vai uma confissão que todos considerarão infame.
Fumo charutos desde os 20 anos,
médicos, parentes, amigos, eu próprio, tudo fizemos para deixar o vício.
Desanimei e assumi. Outro dia, depois de um jantar em casa de cerimônia, fui
para a varanda de um apartamento na Avenida Atlântica. Puxava as tragadas do
meu Romeo y Julieta, bitola Churchill, quando uma dama que os jornais chamam
"da alta sociedade", veio falar comigo.
Não podia recebê-la de charuto na
boca ou na mão. Não havia cinzeiros, todos ali eram saudavelmente
antitabagistas. Jogar o charuto no chão seria porcaria e falta de respeito para
com o dono da casa. Não tive outro jeito. Disfarcei o que pude e atirei o
charuto para a calçada, nove andares abaixo.
Só depois, encostado na amurada,
conversando com a dama sobre o caso do Garganta Profunda, olhei para a calçada
e vi um cidadão fazendo gestos alucinados e proferindo, para cima, as palavras
que costumamos dizer em situações semelhantes. Fora atingido por um charuto
perdido.
Temi que ele viesse averiguar de onde
partira a agressão. Fatalmente chegaria a mim. Disse para a dama o que me
parecia de mais profundo sobre o Garganta Profunda, pedi licença e fui para o
lavabo. Onde fiquei o tempo que me pareceu seguro para que a indignação do
homem, lá embaixo, passasse e ele fosse embora, tendo o que contar sobre a
decadência dos bons costumes.
-- Ananias: no começo, eu dizia “não quero” e ponto final. Mafalda insistia para que não fosse tão direto, grosseiro. Passei a adotar uma estratégia. Se os pais são católicos, digo que somos evangélicos. Se eles são evangélicos, digo que não saímos do terreiro...
Por Orlando Silveira
http://orlandosilveira1956.blogspot.com.br/2017/01/nem-pensar-ananias.html#comment-form
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Por Orlando Silveira
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