SEM RUMO OU LADEIRA ABAIXO? FOTO: ARQUIVO GOOGLE |
A SEGUNDA
CHANCE DE TEMER
Não foi a lavada que o governo esperava, mas
deu para o gasto,
com alguma folga. Foram 263 votos, contra 227.
Deram a Michel Temer
uma segunda chance
Por Marco Aurélio Nogueira
Estadão – 03/08/2017 | 11h16
Conseguida
na bacia das almas, a vitória do governo precisa ser relativizada. Não é
daquelas que deixam o vencedor dormir o sono dos justos. A articulação que a
possibilitou teve de tudo: pressão, promessas, ameaças, troca de favores,
negociações, liberação de emendas. O “centrão” nadou de braçada nesse ambiente
sem substância democrática e pouco republicano. O PSDB bateu cabeças o tempo
todo, fiel a seu estilo desunir para perder. O próprio PMDB não votou unido. Os
Democratas de Rodrigo Maia se saíram melhor, trabalhando a boca pequena.
A
oposição não caprichou no discurso, não foi persuasiva, não mostrou habilidade,
deixou-se levar pelo histrionismo vazio de suas principais lideranças. Subiu no
surrado pedestal da moralidade, como se não tivesse que olhar para os próprios
pés e fazer sua autocrítica. Manteve a lenga-lenga de que, antes, éramos
felizes e não sabíamos, sem nem sequer explicar por quais motivos Temer foi
vice de Dilma por duas vezes.
Foi um
dia feio para a democracia brasileira. O governo ganhou porque não teve oposição
à altura e porque soube se beneficiar da ideia pragmática e prudencial de que é
melhor com Temer do que sem ele, que ao menos está “sabendo reduzir a
inflação”.
O cenário
mostrou uma Câmara em um de seus piores momentos, extensão daquilo que ocorreu
no impeachment, em 2016. Não foi por acaso que Temer se projetou como vice de
Dilma. O estrago vem lá de trás e sempre seguiu vias tortuosas, que agora
cobram o preço. Tudo medíocre demais, patético demais, como se nada de muito
sério estivesse em discussão. O que importava era mostrar a cara para os
eleitores, valendo-se da retórica inflamada, de caras e bocas, de apelos
passionais, de juras de ódio ou amor. Até tatuagens foram feitas, ou encenadas.
NOGUEIRA (FOTO: RODRIGO CANCELA) |
Saberá
Temer aproveitar a segunda chance?
Não é de esperar.
Ele fez um pacto de sangue com o “centrão”, viu o grupo de Rodrigo Maia crescer
em poder de articulação, distanciou-se das correntes que poderiam emprestar
alguma credibilidade, alguma dignidade programática e alguns quadros teóricos a
seu governo. Não dá para acreditar que, de um dia para o outro, reformulará
tudo e se reinventará. Jura que voltará a se empenhar por reformas, mas não
mostra ter forças ou votos para isso. Continua a ser puxado para baixo pelo
perfil rasteiro do ministério, pela mediocridade parlamentar e pelo discurso
chocho do próprio Presidente.
A decisão
de ontem deverá ter pouco impacto no processo político que já aponta para as
urnas de 2018. Ninguém ganhou com ela. Todos perderam.
Temer não
ficará sangrando em céu aberto, ainda que parte de suas vísceras estejam
expostas. Pesará nada em sua sucessão, com poder zero para influenciá-la. Há
uma interrogação flutuando sobre ele: como chegará até o fim? Lula tem imensos
problemas e até os passarinhos do Planalto sabem que sua eventual candidatura é
mais um problema que uma solução, inclusive para ele próprio. Bolsonaro segue
em busca de um partido e de uma plataforma civilizada, fazendo o possível para
cortejar a direita, os ressentidos e os incautos. Tucanos estão em revoada, sem
saber em que galho pousar. E Marina está, por enquanto, em fase de aquecimento.
A vasta e
pouco estruturada área democrática do país permanece na expectativa, em
stand-by, sem saber o que lhe reservará o dia de amanhã.
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