EREMILDO, O IDIOTA, FEZ ESCOLA |
OS TIPOS DO INSTAGRAM
Tenho simpatia especial pelos escritores da internet.
Toda noite, escrevo um microconto
Por Walcyr Carrasco
Época Digital
08/08/2017 - 08h00
Há um vasto painel de tipos
humanos espalhado pelo Instagram. Amores, emoções íntimas, viagens, tudo isso é
exposto na internet. Ter um número elevado de seguidores ou de likes é uma vitória. Não sei exatamente
de que tipo, mas é assim que as pessoas se sentem: vitoriosas. Ao contrário do
que todos pensam, o Instagram não revela a vida como ela é. Como diria
@paulocoelho, cada um trata de exacerbar o que seria sua lenda pessoal. Melhor
dizendo: a ficção que construiu sobre a própria vida. Atores e atrizes, por
exemplo, colocam fotos glamourosas, com fundos lindíssimos. Ninguém bota foto
espirrando, com cara de gripe. Mas famoso não espirra?
Boa parte são fotos patrocinadas.
Sutilmente, mostra-se algum produto. É um post pago. Trabalho. Manter um número
crescente de fãs significa aumentar o saldo bancário. Dá-lhe glamour!
Numa categoria imediatamente
abaixo estão os musculosos. Famosos somente no Instagram. Postam fotos na
academia, fazendo musculação. Tirando a camiseta na praia. Imagens de sucesso,
embora boa parte esteja matando cachorro a grito. Usam os posts para conseguir
academia e suplementos gratuitos. Muitos, no Rio de Janeiro e em cidades
praianas, vêm da periferia, de ônibus. Basta uma sunga para abrirem a cauda de
pavão. E têm seguidores, alguns na casa do milhão! Opa! Mulheres também, mas
são mais ousadas. Embora o Instagram não permita, muitas conseguem exercer a
mais antiga profissão do mundo. E têm ajuda tecnológica: recentemente, o perfil
do meu sobrinho de 18 anos foi invadido por hackers. Uma multidão de
prostitutas russas, falando em russo, começou a se oferecer por ali. Pode!?
Recuperar o domínio foi difícil...
Alguns perfis demonstram uma
vocação incrível para guias turísticos. Bastou fazer a mala, antes de viajar,
já publicam foto. Um está no Central Park em Nova York e precisa anunciar isso
para a humanidade. No Google há fotos muito melhores do Central Park, claro. Ou
do David de Michelangelo. Qual compulsão leva alguém a fotografar o David sem
nem posar na frente? Ou um pedaço de torta que comeu na França? Ou se mostrar
numa lancha? O mais divertido é que os viajantes voltam a sua cidade, mas
continuam postando os cliques da viagem o resto do ano, como se ainda
estivessem em algum outro lugar do mundo.
Qual é o mistério de @selenafox?
É uma celebridade do mundo alternativo. Pratica a wicca, que procura reviver
com louvor o mundo da magia celta. São fotos com a natureza, rituais. Muitos
likes. Como ela, outros mostram suas crenças. Ou arte. Há muitos que mostram
desenhos apocalípticos, de que gosto muito. Mais radicais, outros exibem
tatuagens, as mais inventivas, e provavelmente dolorosas – mas esse grupo não
está de certa forma associado aos que exibem a musculatura? Tudo é exibição,
afinal. Ou as patricinhas que se clicam com as roupas da moda. As mais
sofisticadas. Ganham um dinheirão postando bolsas, sapatos. Nas últimas semanas
de moda tiveram tratamento de primeiras-damas fashion. Outros, como
@gabrielapugliesi e @erasmomtb, provam que a vida é um deleite. Muitos hotéis
paradisíacos. Uma dieta para manter seus belos corpos. São ícones dos que se
dedicam a estilo de vida. Não necessariamente o que podem ter, mas aquele que
desejam.
Tenho simpatia especial pelos
escritores da internet como @neologismos, @zackmagiezzi, @homemquesente,
@brunorazzec, @quintaldasestrelas. Mas há muitos mais. Postam frases, poesias.
Revivem autores como Clarice Lispector e Caio Fernando Abreu. Publicam seus
próprios textos. Uma vitória contra o mundo editorial, que hesita em investir
nos novos autores. No meio deles há os que adoram uma autoajuda, como
@osegredooficial.
Ninguém vence a compulsão por
postar selfies. Não entendo. Por que querem mostrar que estiveram ao lado de
uma pessoa famosa? Ou que têm mãe, exibindo a pobre velha com uma faca na mão
quando corta cebola? Ou desconhecidos numa festinha de aniversário?
Eu me apaixonei pelo Instagram.
Inevitável que poste muito sobre novelas. Todas as noites, escrevo um
microconto. Adoro. São contos mínimos, com palavras milimetradas. Garanto,
aprendi a centrar a ação em poucas frases, contando uma história inteira.
Não me engano. O Instagram é um
bom local para expressar pensamentos, fazer amigos. Mas não é minha vida.
E me assusto. Há quem seja capaz
de postar foto quase sem roupa. Quando vem uma reação, diz que era sua vida
privada. Instagram é público. Muita gente pensa que não.
***
talvez você goste de ler
PERDOAR? PERDOEI
Mas não me peça para ser hipócrita.
Toda vez que relembro (ainda que não queira)
dói uma enormidade.
Por Orlando Silveira. Em "Rapidíssimas"
https://orlandosilveira1956.blogspot.com.br/2017/08/rapidissimas_8.html#comment-form
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