quarta-feira, 13 de maio de 2015

COISAS DA VIDA

www.reticenciasdigitais.com.br


A FILA

Agenor era um cambista de Nova-Cruz, e a esposa, Maria da Paz, era costureira.  O casal tinha cinco filhos, três meninos e duas meninas.

“Pau d’água” inveterado, o passador de bicho não conseguia chegar em casa sóbrio. Procurava sempre fazer confusão, e tentava bater nos filhos por qualquer tolice. A esposa não permitia e a briga era inevitável. Quase sempre, a mulher saía apanhada, levando, no mínimo, uns empurrões. Entretanto, em mesa de bar, Agenor mostrava-se educado e prestativo aos companheiros de copo.

O dinheiro de Agenor era curto, mas o da sua bebida era sagrado. Totalmente dominado pelo álcool, cada vez mais a convivência com a esposa e os filhos tornava-se insuportável. Sua violência em casa estava aumentando assustadoramente. Frustrado por não ter feito nenhum esforço para vencer na vida, descarregava sua revolta na família.

Numa sexta-feira, no começo da noite, como sempre, Agenor chegou embriagado, e “dando coice no vento”. Parecia que vinha com o diabo no couro. Entrou trôpego, foi direto para o banheiro, e, ao sair, ordenou aos cinco filhos e à esposa que fizessem uma fila no meio da sala. Achando que era uma brincadeira do pai, as crianças se posicionaram em fila, e Agenor ordenou que a esposa fosse a primeira. Agenor trazia escondido nas mãos um chicote, e gritou que, daquele dia em diante, todos teriam que fazer uma fila para apanhar de chicote. Isso serviria para punição daquilo que tivessem feito de errado durante o dia...

-- E tu, mulher, vais ser a primeira a apanhar!

Violante Pimentel é procuradora aposentada
 do Estado do Rio Grande do Norte

E o bêbado procurou logo açoitar a mulher, segurando-a pelo braço.  O cretino só não esperava a reação dela e dos filhos. O mais velho, de treze anos, segurou o pai, ajudado pelos irmãos mais novos, e conseguiram contê-lo. A mulher conseguiu tomar o chicote do marido, e, com ele, deu-lhe uma grande e merecida surra. Agenor ficou prostrado ao chão, bêbado e desmoralizado.  Em seguida, Maria da Paz e  os cinco filhos foram se refugiar na casa dos pais dela, que os acolheram penalizados e revoltados.

Na manhã seguinte, passada a carraspana, Agenor dirigiu-se à casa dos sogros, à procura da esposa, que, dessa vez, recusou-se, definitivamente, a voltar para a sua companhia.  Para ele, o mundo quase desabou.  Como iria viver sem aquela mulher, que há quase quinze anos cuidava da sua roupa, fazia-lhe a comida, e vivia numa máquina a costurar pra fora, como meio de manter a casa?!!!  Agenor chorou, e, pela centésima vez, pediu perdão à esposa, de joelhos, jurando que não voltaria a beber. Irredutível, a mulher não voltou atrás e lhe comunicou que iria pedir a separação judicial.

Os sogros de Agenor não quiseram se envolver na discussão, mas quando viram que a decisão da filha, agora, era séria, exultaram de satisfação.

A fila para apanhar foi a gota d’água para que o casamento, finalmente, terminasse. De nada valeram os apelos anteriores da esposa para que Agenor deixasse de beber ou pelo menos maneirasse o vício.

Houve a separação do casal, e Agenor continuou sua trajetória etílica, separado da família até o fim dos seus dias.





Nenhum comentário:

Postar um comentário